São Paulo, domingo, 6 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Bancos ajustam juros à espera do real

NILTON HORITA
DA REPORTAGEM LOCAL

Atrás da aparente normalidade da vida financeira do país, os bancos estão vivendo um dos períodos mais truncados desde o Plano Collor 1. O mercado financeiro passou a semana na retranca e continua, bem ao estilo de jogo da Seleção Brasileira.
A tática é assumidamente cautelosa. Depois de reduzir drasticamente o giro das negociações na primeira semana de lançamento da URV e isolar o dinheiro no curtíssimo prazo, os bancos vão, a partir de amanhã, praticar juros defensivos.
Vai valer o chamado spread "jacaré": para vender CDBs prefixados, juros menores; para repassar esses recursos na forma de empréstimos, juros mais salgados. "É muito natural que em momentos de turbulência, todo mundo fique na defesa, como time pequeno", afirma Alcides Lopes Tápias, presidente da Febraban (Federação Brasileira das Associações de Bancos). O objetivo é acabar com as operações prefixadas antes da troca de moeda. Para isso desestimulam-se aplicações e empréstimos.
O cidadão comum deve refugiar o dinheiro em fundos de commodities, que dão liquidez diária. O que assusta os bancos é o número mágico da conversão do 1.000 por 1. Ganhou a cabeça de muita gente a idéia de que o governo vai antecipar a criação do novo padrão monetário para quando o dólar comercial estiver cotado a CR$ 1.000, o que pode acontecer a partir de 8 de abril.
Para evitar tablitas ou ter de pagar um juro que ninguém sabe qual será na economia pós-Real, os bancos travam as operações de intermediação, pois os CDBs prefixados de 30 dias vendidos nesta semana vencem no período que o dólar pode estar cotado a CR$ 1 mil. "Ninguém tem lá muita convicção disso", diz Carlos Fagundes, diretor financeiro do Banco Itamarati. "Mas como seguro morreu de velho, o negócio é armar redes de proteção."
Com o futuro indefinido, o sistema se fecha em si mesmo. "Enquanto essas coisas ficam no ar, os agentes exercem o seu papel de se resguardar", afirma Ricardo Braga, diretor financeiro do Citibank. "Primeiro se reduz o giro dos negócios, depois isso evolui para a taxa, que passará a ser desconfortável."
Porta de escape
Para abrir uma porta de escape para as tensões mercado, segundo Maurício Schulman, presidente do Conselho de Administração do Bamerindus, o BC precisa permitir negócios financeiros em URV (Unidade Real de Valor), gradativamente, e avisar com antecedência quando será a conversão de moeda.
"No momento, estão todos muito inseguros", afirma. "Se o governo não autorizar algumas operações em URV, o mercado pára de vez." Sem coragem para assumir grandes riscos, a praça financeira realiza gestões frequentes para tentar resolver sua ansiedade de saber quando o governo vai lançar títulos públicos em URV.
Além disso, torce para que o BC autorize operações de descontos de duplicatas e CDBs em URV, já nesta semana. "É difícil que o mercado ganhe tranquilidade sem estas providências do BC", afirma Antônio Costa, vice-presidente executivo do Banco SRL. O mercado financeiro, portanto, já vive os efeitos indiretos do programa de estabilização econômica.
Ao mesmo tempo que retrai as operações prefixadas, os juros dos export-notes, por exemplo, passaram de 20% para 25% ao ano na semana passada e há uma enxurrada de pedidos para lançamento de eurobônus por parte de empresas e bancos no Banco Central. "A lógica é que depois da conversão da moeda, o grande negócio será estar endividado em dólar", explica Candido Botelho Bracher, diretor financeiro do Banco BBA. (Nilton Horita)

Texto Anterior: IR será menor na transição
Próximo Texto: Mercado e BC divergem sobre taxas
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.