São Paulo, domingo, 20 de março de 1994
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A representação classista na Justiça do Trabalho

CARLOS MOREIRA DE LUCA

O artigo assinado pelo presidente da Associação dos Juízes Classistas da Justiça do Trabalho de São Paulo ("O juiz classista na Justiça do Trabalho", na "Folha" de 13.03.94, pág.4-2) faz a defesa dos juízes classistas com inverdades e ataques gratuitos e injustificados aos juízes togados.
As informações quanto à composição dos conflitos trabalhistas nas democracias desenvolvidas são distorcidas ou erradas: por brevidade, diga-se que a representação classista na Itália deixou de existir com a queda do corporativismo fascista, passando o julgamento a ser feito por juiz togado.
Pretende o artigo imputar ao juiz togado excessivo formalismo, quando o que faz é cumprir a lei que disciplina o processo, ao mesmo tempo em que propõe mudanças no sistema processual, para torná-lo mais ágil.
Inverdade é dizer que apenas os classistas fazem acordos. Os juízes togados também conciliam as partes: nas comarcas onde não existe Junta de Conciliação e Julgamento, os juízes de direito julgam os processos trabalhistas sem a participação de classistas, e celebram o mesmo número de acordos, como registra o presidente do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná.
A diferença está em que os classistas se limitam a fazer acordos, e ao juiz togado incumbe todo o trabalho, que é estafante: examina e institui os processos, profere despachos, dirige e julga a execução, estuda o processo e redige a sentença, que é apresentada aos classistas, que deverão votá-la (CLT, art. 850). Quem julga, portanto, é o juiz togado.
A eleição dos classistas tem sido acusada, muitas vezes, de farsa, só existente nas atas forjadas e assinadas pelo compadrio. A revista "Veja", edição de 09.03.94, pág. 44, dá amostra das distorções que existem nesta área.
Se formos examinar os sindicatos que indicam classistas, veremos que são muito poucos os que representam categorias significativas, e poucos os classistas que têm militância sindical. A existência de inúmeros clãs de juízes classistas é sintomática: o próprio presidente da associação dos juízes classistas, juiz do TRT, tem sua esposa e genro como juízes classistas de Juntas de Conciliação e Julgamento.
Os juízes togados têm pedido a extinção da representação classista porque ela é comprometida com uma das partes, não sendo imparcial, como deve ser todo juiz. Por outro lado, os gastos com a representação classista são enormes, alcançando, em um ano, US$ 203 milhões, sendo que a tendência é que aumentem a cada ano. Como os classistas têm a aposentadoria paga pela União após apenas cinco anos no exercício da função, é enorme a proporção dos aposentados: existem 1.364 juízes classistas aposentados para 2.344 em atividade!
Estão em jogo enormes interesses, pois ser juiz classista implica posição social, prestígio político e rendimentos iguais aos dos juízes togados, nos tribunais, e até 2/3 dos do juiz presidente, nas juntas, além do direito à aposentadoria. Isso tudo continuando com as suas atividades profissionais e empresariais, podendo, inclusive, advogar. Para defender tantas vantagens, não faltam recursos aos juízes classistas. Os da 2ª Região decidiram, em assembléia realizada dia 19.07.93, destinar mensalmente 4% do total do "salário-base" a favor de sua associação.
Cabe ao Congresso decidir quanto à permanência da representação classista ou pelo seu desaparecimento. A oportunidade é agora. E cabe à sociedade manifestar-se, num sentido ou em outro.

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