São Paulo, domingo, 20 de março de 1994
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Como colocar os clientes em primeiro lugar

RICARDO GANDOUR
EDITOR DE SUPLEMENTOS

Essa coisa de "o cliente em primeiro lugar" vai longe. Pelo menos no que depender de Richard Whiteley, consultor norte-americano e autor da teoria "A Empresa Totalmente Voltada para o Cliente", que lhe deu fama e virou livro –à venda no Brasil– em 1991.
Whiteley, 54 anos, não carrega sozinho a bandeira. É de Peter Drucker, o pai da administração moderna, a frase "a única finalidade válida de uma empresa é gerar um cliente". Theodore Levitt, o guru do marketing, foi além: "A finalidade de uma empresa é gerar e manter o cliente".
Um dos méritos de Whiteley está em ter traduzido sua teoria em tarefas práticas –como a da formação dos "grupos de enfoque", em que se estudam os gostos e os hábitos da freguesia.
O consultor foi o comentarista do primeiro fascículo "Qualidade Total", lançado pela Folha e pelo Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) domingo passado. No próximo dia 29 ele estará em São Paulo, onde conduz um seminário no Palácio das Convenções do Anhembi, promovido pela HSM Cultura & Desenvolvimento, com apoio da Folha. Dia 31, a palestra se repete em Porto Alegre, no hotel Plaza São Rafael.
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Folha - O sr. escreveu que satisfazer os clientes já não basta. As empresas ficaram iguais?
Richard Whiteley - Sim, e esse é um ponto vital. Hoje os consumidores estão formando seus conceitos a partir de experiências com empresas de vários tipos. Ao entrar em meu banco eu estou influenciado pelo tipo de atendimento que eu tenho em uma lanchonete do McDonald's. Para os executivos, tornou-se essencial aprender como diferenciar suas companhias.
Folha - A pesquisa de mercado é um bom meio de se estudar os consumidores?
Whiteley - É importante ter um "pé atrás" em relação à pesquisa de mercado tradicional e procurar enxergar de perto o que os clientes estão querendo.
Folha - Como?
Whiteley - Para começar, é preciso identificar quem são os clientes que se quer servir. Isso já dá condições de segmentar o negócio. Então eu montaria "grupos de enfoque" com os clientes identificados. Em cada grupo, eu selecionaria que aspectos dos meus produtos e serviços são importantes para eles –por que eles comprariam de mim e não da concorrência. Eu esquematizaria esses grupos com o claro entendimento de suas necessidades e da prioridade e importância de cada uma delas. Daí, enviaria a eles um questionário com questões do tipo: 1) como sente que estamos operando; 2) como estamos em comparação com a concorrência e 3) como poderíamos melhorar. E faria isso pelo menos uma vez por ano.
Folha - Às vezes um pedido perambula por vários departamentos. Como fazer com que todos se envolvam diretamente?
Whiteley - Frequentemente as pessoas que criam produtos e serviços nunca viram um cliente. Há várias maneiras de motivar esse pessoal: 1) colocar a "voz do cliente" dentro da empresa –divulgar a todos o que os clientes querem; 2) fazer vídeos com os clientes falando sobre os produtos e serviços da empresa; 3) convidar clientes para visitar a empresa e falar sobre seus produtos e serviços –uma experiência muito boa para os funcionários; 4) enviar funcionários para visitar os clientes.
Folha - Isso também vale para o conceito de cliente interno?
Whiteley - Certamente. É um conceito importante, falado e aceito, mas não muito bem implementado. É o seguinte: todos na companhia têm um cliente. Se eu não sou da área de vendas ou de atendimento –não estou diretamente exposto–, eu certamente estou ajudando alguém que está em contato direto. Essa pessoa dentro da empresa é meu cliente. Deve-se, ao menos uma vez por ano, reunir-se com ela e dizer: "Você é meu cliente, como posso servi-lo?". Há funcionários que ainda pensam que fornecer serviços internamente é ser subserviente.
Folha - Imagine a seguinte situação: tocam dois telefones, ao mesmo tempo, em sua mesa de trabalho. Em uma linha está seu chefe imediato, que lhe pede uma informação estratégica e urgente. Na outra, um cliente. Quem o sr. atenderia primeiro?
Whiteley - Claro que o cliente. Mas essa situação ilustra o que ainda acontece em muitas empresas –voltadas para si mesmas, para suas próprias necessidades.
Folha - O sr. tem encontrado empresas que começam um programa de melhoria apenas por que se sentiram obrigadas por uma crise conjuntural, mas não estavam necessariamente envolvidas com as mudanças?
Whiteley - Sim, e acho que a Ford é um bom exemplo. Eles não queriam mudar da maneira como acabaram mudando, mas em 1980 eles estavam correndo o risco de sucumbir. Como resultado da crise, eles abraçaram o "Total Quality Management". Agora estão liderando o renascimento da indústria automobilística norte-americana. Essa é uma história feliz. Mas eu conheci empresas que embarcaram em programas de qualidade apenas por que todo mundo estava falando nisso, mas efetivamente não ofereceram nada de diferente a seus clientes.

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