São Paulo, domingo, 20 de março de 1994 |
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Para Almodóvar, um enigma pavoroso
PEDRO ALMODÓVAR
O cineasta escreve sobre a Aids Origem de algumas das maiores mudanças neste fim de século (e sua incógnita mais pavorosa), nunca saberemos como teria sido o mundo sem a aparição desta espantosa doença. O pior: o modo como a sociedade não-contaminada vive a doença. Dispara os piores preconceitos, promove os argumentos mais reacionários. É terrível ver como a doença entra e sai nos meios de informação pelas razões menos sérias (um infectado famoso, etc). Ainda não existe uma consciência suficiente da doença. O Ocidente só começou a se preocupar com ela quando viu que até um esportista de elite a tinha contraído. Enquanto isso, o Terceiro Mundo corre o risco de desaparecer, sem que façamos nada para remediar esta situação. Ali existem muito poucas estrelas, e se existem, não as conhecemos aqui, assim não podemos julgar o impacto com a notícia de que contraíram o estigma. Também não existe comunicação entre os pesquisadores. Temos a impressão de que todos os cientistas se meteram em uma louca e secreta corrida para ver quem consegue inventar primeiro a vacina, porque, assim, entrarão de um modo fulminante e em letras garrafais na história. É responsabilidade de todos informar, ajudar, contribuir economicamente, aliviar a convalescença e a agonia dos doentes. E não esquecer que ela pode atingir qualquer um. E muito menos esquecer que os doentes o são 365 dias por ano, e não apenas em 30 de novembro ou quando algum apresentador de televisão quer dar um prova de generosidade. De todo modo, este é o único caso em que não importam as motivações dos que montam semelhantes espetáculos. Sempre que se saque do dinheiro, e que ele seja entregue pontualmente, vale tudo. Texto Anterior: Ópera salva 'Filadélfia' do desastre Próximo Texto: Escritores ficam entre militância e memórias Índice |
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