São Paulo, segunda-feira, 21 de março de 1994
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Itamar usa artifício legal para não pagar Judiciário

TALES FARIA; WILLIAM FRANÇA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Itamar Franco concluiu ontem que não tem meios jurídicos para forçar o STF (Supremo Tribunal Federal) a voltar atrás na decisão de aumentar os salários do Judiciário, e definiu a seguinte estratégia: como a LDO proíbe criar despesas sem receita, o governo vai alegar, pura e simplesmente, que o Tesouro não tem caixa para pagar os aumentos. No caso do aumento que os parlamentares se autoconcederam, o governo já tem como certo que os senadores vão derrubar essa decisão.Com base em consultas feitas pelo ministro da Justiça, Maurício Corrêa, a juristas não-ligados ao governo, o Executivo avalia que o impasse provocado pelo fato de o Tesouro não pagar os aumentos deverá levar o STF a recuar.Na estratégia do Planalto também ficou acertado que o governo não vai entrar com qualquer ação contra o STF. Das consultas a juristas, Corrêa concluiu que o STF também não tem como forçar o Executivo a pagar os aumentos autoconcedidos pelo Legislativo e pelo Judiciário.Ontem, o presidente do STF, Octavio Gallotti, que já enviou a folha de pagamento ao Tesouro calculada com o aumento, disse que o STF "só vai se manifestar quando a decisão (do Executivo) se tornar oficial. Aguardaremos e com toda a serenidade analisaremos a atitude a tomar."Corrêa confirmou que o governo não voltará atrás no repasse, mas não entrará com ação judicial contra o STF. Ele disse esperar que o tribunal volte atrás por conta própria: "Os ministros do STF são homens sérios e tão preocupados com a nação como todos nós. Tenho esperanças de que, por conta própria, irão rever sua decisão".Segundo conclusão do Executivo, a decisão dos ministros do STF e dos congressistas de converterem seus salários para URVs (Unidades Reais de Valores) tomando como base o dia 20 de cada mês –e não dia 30, como estabelece a MP 434– provoca um aumento de gastos de cerca de US$ 270 milhões ao ano. A saída encontrada pelo governo é baseada em uma tese jurídica chamada "princípio da impossibilidade material".Essa tese, sugerida ao governo pelo tributarista Ives Gandra, já foi utilizada pelo próprio governo quando juízes determinaram a prisão de funcionários do INSS que alegavam que não iam pagar os 147% de reajuste aos pensionistas. "Em vez de dizer que não paga, que soa como desobediência, diz-se que não tem como pagar, o que é um direito", explica Gandra.Caso adote essa tática, a única saída para o STF e o Congresso exigirem que o governo pague a diferença nas URVs seria entrar com ação contra Itamar, acusando-o de "crime de responsabilidade". A autorização para abrir esse processo teria que ser dada pelo Congresso –e Itamar tem como certo que não há condições políticas de o Legislativo votar seu "impeachment" pelo fato de proteger o caixa do Tesouro.

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