São Paulo, quarta-feira, 23 de março de 1994
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Três são linchados na frente da TV

JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM LONDRINA

O médico Cláudio Marques de Almeida, 44, seu cunhado, Heitor Ítalo Cangnin Filho, 29, e o agente policial Rodolfo Annechino Neto, 28, foram linchados na frente da câmera da TV Globo anteontem à tarde em Salto do Lontra (550 km a sudoeste de Curitiba). O linchamento ocorreu após o enterro da enfermeira Eronildes Ribeiro Comelatto, 28, que teria sido assassinada no domingo por Cangnin Filho e Annechino a mando do médico Almeida.
Eronildes foi morta às 17h35 de domingo quando, com a colega de trabalho, Elenize Zimmer, 23, ia de Linha Toscan, onde morava, para o hospital Nossa Senhora de Fátima, onde trabalhava, em Salto do Lontra.
Segundo Elenize, as duas foram interceptadas por um Fiat Uno vermelho em que estavam Cagnin Filho e Annechino Filho, detetive da Polícia Civil do Rio. Ele disse à polícia que Heitor apontou Eronildes para Annechino e este disparou cinco tiros com um revólver Rossi calibre 38. Eronildes morreu no local. Elenize conseguiu fugir enquanto Annechino recarregava a arma, e avisou a polícia.
Presos uma hora depois no município de Santa Isabel do Sudoeste, Annechino e Heitor confessaram o crime, segundo a polícia. Annechino teria dito que recebeu CR$ 500 mil para matar a enfermeira a mando do médico Cláudio Marques de Almeida, com quem a enfermeira tinha uma disputa trabalhista.
Eronildes havia trabalhado dois anos no hospital São Jorge, de propriedade de Almeida, e teria uma audiência na Justiça do Trabalho no próximo dia 25. Ela reclamava direitos trabalhistas que não teriam sido pagos por Almeida. O médico foi preso preventivamente às 3h de segunda-feira.
Às 17h45, no cemitério de Salto do Lontra, o marido de Eronildes –Volmir Comelatto–, o pai dela –Naro Ribeiro– e o tio –Flor Ribeiro– estavam armados. Os três são acusados de liderarem o linchamento, que foi filmado pela Rede Paranaense de Televisão, afiliada à Rede Globo. A polícia está se baseando nas imagens de TV.
As imagens do linchamento foram levadas ao ar ontem na primeira edição do "SP Já", às 13h. Foram exibidas cenas do local onde a enfermeira foi morta, a chegada de dois acusados à delegacia, a multidão que acompanhou o enterro de Eronildes e a invasão do DP. Em seguida, os invasores arrebentam a porta da carceragem e lincham os três acusados.
Após o enterro, uma multidão estimada em mais de 1.000 pessoas se aglutinou em frente à cadeia da cidade. Os seis PMs e dois agentes da Polícia Civil foram dominados e Almeida, Amexino e Cagnin Filho foram retirados de suas celas e linchados a pauladas e tiros.
Até a tarde de ontem, a Polícia Civil de Salto do Lontra não havia prendido nenhuma pessoa em razão do linchamento. Os irmão Ribeiro e Comelatto estavam foragidos.
Afastado
A Secretaria de Polícia Civil informou que Rodolpho Annechino, 28, um dos três homens linchados em Salto do Lontra, no Paraná, era detetive da polícia do Rio. Annechino estava afastado da polícia desde abril de 93 e respondia a inquérito administrativo por ter faltado ao serviço por 30 dias consecutivos.
Annechino entrou para a polícia no dia 1º de abril de 89, segundo informa sua ficha funcional, e passou por sete delegacias, entre elas a de Roubos e Furtos (DRF) e a de Entorpecentes (DRE).

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