São Paulo, quinta-feira, 24 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Procurador-geral aponta 'ato de ditadura'

ELVIS CESAR BONASSA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O procurador-geral da República, Aristides Junqueira, afirmou que o país está assistindo atos de uma ditadura de fato. As declarações do ministro-chefe do Emfa (Estado Maior das Forças Armadas), Arnaldo Leite Pereira, de que "interessa o que está escrito na lei, não o que o Supremo Tribunal Federal acha", significam a usurpação dos poderes constitucionais conferidos ao Poder Judiciário, segundo Junqueira.
"Até o desmentido dessa declaração, estamos frente a um ato de ditadura", disse o procurador, em entrevista à Folha. Pela Constituição, cabe exclusivamente ao Poder Judiciário interpretar a lei. O Executivo, constitucionalmente, está obrigado a acatar essa interpretação e não fazer as suas próprias, como propôs o chefe do Emfa.
Outro ato condenado pelo procurador: o Executivo cortou o salário dos servidores do Judiciário diretamente na folha de pagamentos. O desconto foi feito sobre o salário líquido dos servidores. Isso é considerado por Junqueira como uma interferência na autonomia do Judiciário. O máximo que o Executivo poderia fazer seria cortar o valor global do dinheiro repassado para o Judiciário.
O procurador-geral está sendo uma peça-chave nas negociações para superar a crise institucional. Novamente citando a Constituição, Junqueira lembra que cabe à Procuradoria "defender o regime democrático". O procurador afirmou a assessores que esta é a "mais grave crise institucional" que ele já viveu na Procuradoria.
Na manhã de ontem, Junqueira se reuniu com os ministros Fernando Henrique Cardoso (Fazenda), Mário Cesar Flores (Assuntos Estratégicos), deputado Nélson Jobim (relator da revisão constitucional), deputados Sigmaringa Seixas (PSDB-DF) e José Genoíno (PT-SP), e os ministros do STF Paulo Brossard e Sepúlveda Pertence.
O tom da conversa, segundo a Folha apurou junto a seus participantes, foi a necessidade de preservar o STF, mas não pagar os salários de acordo com a conversão pelo dia 20, e sim dia 30, que resulta em uma diferença de 10,94%. A razão: a opinião pública já está formada contra o STF. Ao mesmo tempo, deixar o Supremo como derrotado significaria o fim de sua independência.
Repulsa
O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Octávio Gallotti, abriu a sessão plenária de ontem da Corte reiterando a "repulsa" do tribunal "à intromissão indevida que se acaba de verificar no Poder Judiciário pelo fato de o Poder Executivo ter retirado valores já depositados nas contas". Com isso, a crise dos três Poderes está registrada na história do STF.
Gallotti leu em plenário a nota em que o tribunal "repeliu os insultos grosseiros e inaceitáveis dirigidos à Corte e a seus juízes". O presidente do Supremo disse ser seu "dever proferir a repulsa do STF pelas acusações injustas que tem sido alvo por parte de autoridades públicas".

Colaborou Flávia de Leon

Texto Anterior: 'Bom senso'
Próximo Texto: Senado cancela aumento dado pela Câmara
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.