São Paulo, quinta-feira, 24 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

FHC precisa de ajuda na hora das compras

DAVID DREW ZINGG
EM SÃO PAULO

Sr. FHC,
li sobre as compras que o senhor fez na "Big Apple" outro dia. Acho que o sr. deveria me contratar para ser sua dama acompanhante nas compras. Na sua próxima viagem, eu poderia pelo menos orientar o sr. até o lugar certo em Nova York, para preencher os espaços vazios em seu guarda-roupa pessoal.
Em primeiro lugar, ministro, as pessoas de verdade não compram suas roupas na Alfred Dunhill. Elas compram cachimbos na Alfred Dunhill.
Em segundo lugar, ministro, as pessoas de verdade não pagam US$ 695 por um blazer em Nova York. Na condição de sua dama de compras, eu o teria convencido a descer a avenida Lexington, até a Bancroft's, na rua 51. Trata-se da Brooks Brothers do homem de recursos modestos. Ali o sr. poderia ter levado o mesmo elegante blazer azul por US$ 150.
O tio Dave não é tão bom de matemática quanto Sua Excelência, mas acho que isso dá uma economia de mais ou menos US$ 500. Nada mal, hein, ministro? Se o sr. conseguisse cortar US$ 500 de cada US$ 695 gastos por seu governo, acho que até conseguiria ser eleito.
Se o sr. realmente quisesse economizar dinheiro na minha cidade natal, eu poderia levá-lo até o lugar onde eu mesmo compro minhas roupas, o Cheap Jack's –Joãozinho Barateiro em nova-iorquês. Este é o lugar onde qualquer pessoa que vive e trabalha no Brasil é obrigado a comprar suas roupas, quando está em Nova York. É uma loja de roupas de segunda mão, onde corretores da Wall Street falidos vendem seus blazeres yuppies ex-chiques, antes de voltarem para casa para chorar enquanto tomam a canja de galinha da mamãe, que sai de graça.
O último paletó esporte que tio Dave comprou ali custou US$ 25, ministro. Subtraindo essa soma enorme de US$ 695, sobram US$ 670, pelos meus cálculos. Nada mal para um dia passado com sua nova dama acompanhante de compras, certo?
Acaba de me ocorrer que talvez o sr. se interesse em me contratar para ser seu garoto número um encarregado da economia da Brasilialândia. Juntos, quem sabe conseguíssemos economizar uma pilha de dinheiro para este grande país.
Por falar em economizar dinheiro, chefe, ouvi falar que o sr. pagou US$ 95 por uma gravata de seda. Mal posso acreditar no que ouço, Fernandinho. Vou lhe enviar por fax o nome do lugar onde comprei as minhas –três por US$ 25.
Cobrindo as apostas
Talvez seja interessante descobrir onde sua companhia de seguros ou empresa de convênio médico está investindo seus lucros malganhos. Se elas seguirem o exemplo de uma das maiores companhias do ramo nos Estados Unidos, provavelmente estarão cobrindo suas apostas.
A grande companhia de convênio médico a que me refiro comprou mais de US$ 11 milhões em ações da Philip Morris. Cof, cof, cof.
As superdegustadoras
Na condição de senhor de meia-idade com idéias adolescentes, tio Dave vem observando com bastante inquietação que seu sentido do paladar parece estar se esvaindo pelo ralo. Peixe passou a ter gosto de carne para mim e uma noite destas, no Rodeio, eu confundi salsicha caseira com frango kebab. Chocante. Constrangedor.
Então me deparei com um estudo que afirma que algumas pessoas realmente têm um paladar mais aguçado do que outras. E, horror dos horrores, são as mulheres que têm o paladar mais apurado do que os homens (pare de dar essas risadinhas, você aí no fundo da classe). Parece que a Universidade Yale, aquela que nos deu o inesquecível George Bush, comprovou a existência de "superdegustadores", ou seja pessoas que possuem um número de papilas gustativas muito além do normal.
A probabilidade de mulheres serem superdegustadoras é muito maior do que de homens.
A Universidade Yale descobriu uma maneira de contar as papilas fungiformes, ou seja papilas gustativas, tão minúsculas que são virtualmente invisíveis.
Numa superfície de 0,6 centímetros quadrados, um degustador fraco (como tio Dave) apresentava apenas 11 minúsculas papilas gustativas. Uma "superdegustadora" tinha 1.274. Conclusão: não se esqueça de mascar um chiclete antes de dar um ósculo nela.
Porta giratória
Bem, Joãozinho, pode voltar a ler tua "Playboy" nacional. Na semana passada eu contei a vocês a boa notícia de que Ed Kosner havia saído da revista "New York" e tinha sido contratado para editar –e salvar– a revista "Esquire". A "Esqy" vem descendo lentamente pela íngreme descida que leva à extinção, sob a batuta de uma sequência de proprietários e editores incompetentes.
Mas as coisas mudam rapidamente na "Big Apple". Exatamente quando minha coluna acabava de ser impressa na gráfica da Folha, fui informado que o sr. K estava deixando a "Esqy". Uma pena, uma grande pena. Quando eu conseguir informações confiáveis sobre o porquê, eu passo para vocês.
Diversão cara
Na edição de abril da "Esquire", a última editada por Kosner, a revista publica uma lista do que outros especialistas jornalísticos imaginam que custaria a um inocente superastro norte-americano comprar o silêncio de um garoto de 13 anos que ele nunca molestou sexualmente.
"The Washington Post" – US$ 5 milhões.
Revista "Time" – cerca de US$ 5 milhões em dinheiro e aplicações em fundos.
"The New York Daily News" – entre US$ 5 e US$ 100 milhões.
"The New York Times" – "possivelmente acima" de US$ 10 milhões.
"USA Today" – entre US$ 10 e US$ 50 milhões.
Agência "Associated Press" – entre US$ 10 e US$ 99 milhões.
"The Wall Street Journal" – US$ 20 milhões.
Quando calculei a média das estimativas, cheguei a um mínimo de US$ 7 milhões e um máximo de US$ 48 milhões. Se o desconhecido superastro houvesse passado 30 noites com o sofrido garoto sem nome, teria desembolsado entre US$ 233 mil e US$ 1,6 milhão por noite de sacanagem e bolinação por baixo das cobertas.
Leia tudo sobre o Brasil
A "The Economist" é provavelmente a revista mais respeitada na Inglaterra. Ela tem circulação mundial e é mundialmente respeitada. Se você quiser saber o que será publicado pelo mundo afora na semana que vem, basta ler a "The Economist" desta semana.
A última edição dedica dois artigos ao Brasil. Um deles é intitulado "O Brasil em Obras", e chega à conclusão que apesar de tudo que existe de errado na mente e no corpo político nacional, ainda resta esperança. Então, qual a novidade? A simples ausência de suicídio físico constitui evidência técnica da existência de esperança.
A "The Economist" também dedica uma página inteira a Lula e suas "caravanas da cidadania". A "The Economist" diz, entre outras coisas, que "o próprio Lula habilmente muda seu evangelho de acordo com a congregação que tem à sua frente".
Afirmando que apenas a eleição de Lula para a presidência poderá mostrar o que ele realmente pretende fazer, a "The Economist" dá a impressão de estar confusa. Como muitos outros jornalistas, o repórter da "The Economist" não parecia ser capaz de tirar qualquer impressão real. Politicamente falando, uma página inteira na "The Economist" é ouro para os sonhos de poder de Lula.
Lugar do garçom
Se você é daqueles que acham que o destino sempre coloca um garçom burro e totalmente incompetente à tua mesa, considere a seguinte idéia. É possível que o garçom enxergue o problema de um ponto de vista diametralmente oposto. A Associação do Automóvel britânica pesquisou alguns dos pedidos e das reclamações mais bizarras feitos por clientes de restaurantes:
"Este peixe está parecendo morto demais."
"Por favor, faça meu chateaubriand malpassado –e bem passado também."
"Será que você poderia mandar aquelas ovelhas no gramado ali fora ficarem quietas?"
"Esse teu sotaque francês é evidentemente fajuto."
"Aquelas vacas ali fora realmente têm uma cor muito desagradável."
"Por que o maître anda desse jeito tão estranho?"

Tradução de Clara Allain

Texto Anterior: Forma e fundo se desencontram em 'Ética'
Próximo Texto: Abbey Lincoln canta no Brasil no final do ano
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.