São Paulo, segunda-feira, 28 de março de 1994
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Recomeçar do zero

MARCELO BERABA

SÃO PAULO – O governador Luiz Antonio Fleury Filho vem tentando, e com uma persistência notável, uma operação dificílima –a de se desvencilhar publicamente de um apadrinhamento político. Poucos conseguiram.
Foi Orestes Quércia quem o elegeu em 90. Fleury dificilmente seria governador se disputasse aquela eleição por qualquer outro partido. Quércia fez Fleury praticamente do nada.
Sua personalidade e legítimas ambições políticas estimularam em Fleury, desde o momento em que ocupou o Palácio dos Bandeirantes, o sonho de se distanciar do incômodo padrinho e de alçar vôo próprio. O drama do governador é que a força do quercismo no Estado e no PMDB nacional é de tal magnitude que aparentemente não lhe resta espaço para construir uma liderança alternativa.
Se Fleury reforçar os vínculos com o quercismo, volta a ser um mero liderado e ainda tem de repartir com Quércia o ônus das suspeitas de irregularidades. Se, ao contrário, romper aberta ou veladamente, corre o risco de se isolar, de ser esvaziado politicamente e, pesadelo dos pesadelos, de ser identificado como traidor. E em política isso pode ser fatal.
Em 82, no Rio, o partido mais forte era o PMDB liderado por Chagas Freitas. A imagem do chaguismo estava associada a clientelismo e a tolerância com o regime militar. Chagas indicou para disputar o governo do Estado o seu herdeiro político, o deputado federal mais votado do Rio, Miro Teixeira. No meio da campanha Miro percebeu que perdia terreno para o recém-retornado Leonel Brizola. Tentou então, estimulado pela esquerda do partido, se distanciar do padrinho.
O resultado foi catastrófico: parte do eleitorado achou que era apenas uma jogada eleitoreira; outra parte, que ele estava traindo quem o ajudara. Brizola foi eleito governador e Miro acabou em terceiro. Só depois da eleição é que ficou claro que realmente houvera o rompimento entre Miro e Chagas. Miro deixou o partido e teve de recomeçar sua vida política praticamente do zero –novo partido (PDT), novo discurso, novos eleitores. Passados 12 anos pode-se até dizer que é um caso bem-sucedido.

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