São Paulo, domingo, 3 de abril de 1994
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Revistas 'vendem' brasileiras no Japão

THAÍS OYAMA
DA REPORTAGEM LOCAL

Além dos "dekasseguis" (termo que os japoneses usam para identificar os descendentes nascidos no exterior e que vão trabalhar em seu país), o Brasil também exporta prostitutas para o Japão.
O mercado de prostituição no país, tradicionalmente dominado por coreanas e filipinas, conta com um número cada vez maior de jovens nascidas no Brasil.
Em pelo menos três revistas pornográficas japonesas que oferecem serviços de massagem e sexo, as brasileiras são responsáveis por cerca de 30% dos anúncios. Chegam a cobrar até US$ 500,00 por "programa" (sexo pago).
A polícia japonesa não quis fornecer dados sobre a participação das brasileiras no mercado, mas confirma que tem crescido nos últimos anos. A Polícia Federal brasileira tem a mesma avaliação.
A entrada de brasileiras no mercado tem acontecido, basicamente, de três formas. "Dekasseguis" que vão ao país trabalhar em diversas atividades, às vezes perdem o emprego e acabam se prostituindo.
Outras, muitas vezes não-descendentes de japoneses, deixam o país para trabalhar como prostituta de luxo. Algumas destas chegam a se casar com "nikkeis" (descendentes de japoneses nascidos fora do país) brasileiros para poderem obter visto de trabalho temporário.
O visto para turistas é de 90 dias, mas a lei japonesa concede o visto de trabalho de até três anos para "nikkeis" e suas mulheres.
E existem as que viajam com a expectativa de trabalhar como bailarinas sem saber a atividade que as aguarda. Vão ao Japão a convite de agências que dizem promover "shows brasileiros" lá. Acabam em boates de terceira categoria, onde têm que atuar como "hostess" (anfitriã, em inglês).
No Japão, o termo "hostess" é usado para designar mulheres que trabalham em bares noturnos com a função de conversar com clientes, estimulando-os a consumir bebidas alcóolicas. Eventualmente, aceitam fazer "programas".
Só na cidade de Yokohama (a segunda do país em número de habitantes) existem cerca de 6.000 estabelecimentos deste gênero.
Três bailarinas profissionais ouvidas pela Folha relataram terem sido vítimas do mesmo golpe. Foram ao Japão entre 89 e 93, a convite da mesma empresa, a Berenice Promoções, que fica em Santa Cecília (centro de São Paulo).
Uma delas, Marisa (não quis dar o sobrenome), 24, embarcou para Nigata (cidade próxima a Yokohama) em julho de 93, com a promessa de que faria shows de samba e ganharia US$ 5.000 por mês.
"Quando vi a casa em que trabalharia, desconfiei. Nem palco tinha", conta ela. Durante as três primeiras noites, os donos alegavam que o show havia sido adiado. Ao mesmo tempo, pediam que ela induzisse os clientes a consumir.
"Não me diziam para sair com os fregueses, mas sei que algumas meninas faziam isso. Cheguei a ver garotas fazendo sexo oral com clientes dentro do bar", afirma.
Sua colega Gisela (não quis dar o sobrenome) viajou nas mesmas condições e confirma o relato. As duas dizem que telefonaram para a empresa no Brasil procurando ajuda e não foram atendidas.
A bailarina A.M.S., 34, viveu experiência parecida em 89. Contratada pela mesma empresa, supostamente para shows de chorinho e samba, foi enviada para uma casa de "hostess", em Osaka.
Recusou-se a ficar lá e foi transferida pela agência para outro local, de boa categoria, onde atuou como bailarina. A satisfação foi passageira. "A estratégia foi alternar casas idôneas com de prostituição disfarçada. Voltei após um mês", diz. A bailarina move ação trabalhista contra a agência. O processo ainda está em andamento.
Berenice Nascimento, proprietária da empresa, nega as acusações. Afirma que a agência tem 15 anos e promove "intercâmbio cultural e artístico com o Japão, levando bailarinas profissionais que atuam em hotéis e casas noturnas respeitadas". Diz que no contrato "está terminantemente proibida qualquer atividade ligada à prostituição".
Afirma não trabalhar com "hostess" e desconhecer qualquer episódio de bailarinas forçadas a trabalhar nessas casas.

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