São Paulo, terça-feira, 5 de abril de 1994
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Imposto X sangue

O tema andava meio esquecido, justamente quando se celebram os 30 anos de um golpe militar movido, entre muitas outras, pela questão agrária. Voltou entretanto à superfície com as declarações do coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), Gilmar Mauro, prevendo que em 1994 tripliquem no Brasil as invasões a propriedades.
O uso da terra como reserva de valor é não apenas imoral, mas também atenta contra a ordem natural das coisas, dado que a terra tem como finalidade precípua servir de abrigo e propiciar a sobrevivência, como produtora de alimentos.
A invasão de terras, contudo, é inaceitável. O caminho correto para evitar a manutenção de terras improdutivas são pesadas sanções econômicas, objetivas e compatíveis com o Estado de Direito. Os instrumentos fiscais são legítimos e viáveis, mas nunca foram devidamente usados. O Imposto Territorial Rural, vindo da Constituição de 1891, foi transferido, em 1964, à esfera federal, à primeira vista para promover a reforma agrária.
Na prática, entretanto, a reforma foi engavetada. A carga tributária por imóvel correspondeu em média nos últimos anos a 25% de um salário mínimo por ano. Ou seja, o sistema tributário consagrou o incentivo fiscal ao uso da terra como reserva de valor. Os níveis de arrecadação do ITR são hoje de insignificantes 0,02% do PIB, contra 0,2% arrecadados com o IPTU.
Evidentemente o mal está na falta de vontade política de usar os tributos para evitar a especulação com terras. É preciso diferenciar a reforma agrária necessária da violência contra o direito de propriedade, baseada em atos de fé ou, como quer Gilmar Mauro, na hipótese de que "demonstrações de força" em ano eleitoral venham a surtir mais efeito. O único efeito da violência é convocar, sempre em sentido contrário, ainda mais violência.

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