São Paulo, quinta-feira, 7 de abril de 1994
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Sétima arte já navegou pelos sete mares

FEDERICO MENGOZZI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Navegar é preciso, nem que seja de mentirinha, no escurinho do cinema. Desde que o cinema é cinema e Louis Lumière registrou as cenas de "Barque Sortant du Port"/"La Sortie du Port" (1895), no sul da França, a navegação, esse ato de rebeldia contra os limites da condição humana, faz parte do espetáculo. O crítico francês Georges Sadoul viu qualidades no filme de Lumière, como o enquadramento, "notavelmente construído".
Nem todo filme de mar tem um navio como protagonista e, mesmo nesse caso, nem sempre a trama trata das delícias dos cruzeiros e viagens. "Encouraçado Potemkin" (1925), de Sergei Einsenstein, tem navio até no título, mas quem se arriscaria considerar o filme, que começa com uma revolta de marinheiros russos quando lhes é servida carne estragada, uma mera história de viagens marítimas? Só se for do gênero "viagem ao redor da consciência política".
"O Destino do Poseidon" (1972), de Ronald Neame, marco do filme-catátrofe, também segue a linha cruzeiro-desespero, com "Juggernaut, Inferno em Alto-Mar" (1974), de Richard Lester, e outros nos quais tudo se inicia bem e prossegue muito mal.
Já "A Nau dos Insensatos" (1965), de Stanley Kramer, leva ilustres passageiros (Vivien Leigh, Simone Signoret, Lee Marvin) do México à Alemanha e segue a linha navegar-em-busca-de-si-mesmo ou em-busca-de-seu-destino –o filme se passa no começo dos anos 30, quando os nazistas estão prestes a chegar ao poder.
O filme policial também gosta de navegar, provam "A Dama de Shangai" (1948), de Orson Welles; "O Sol por Testemunha" (1959), de René Clement; "O Quarto do Bispo" (1977), de Dino Risi; e "Morte sobre o Nilo" (1978), de John Guillermin.
Na linha viajar e gargalhar, estão títulos que vão de "Marinheiro por Descuido" (1924), de Buster Keaton –e Donald Crisp– a "A Condessa de Hong Kong" (1967), de seu companheiro de cinema mudo Charles Chaplin, passando por momentos menores como "Assalto a um Transatlântico" (1966), de Jack Donahue.
Na linha musical, destaca-se "O Barco das Ilusões" (1951), de George Sidney, e, na corrente marxista, "Os Quatro Batutas" (1931), de Norman Z. McLeod, e "Uma Noite na Ópera" (1935), de Sam Wood, filmes nos quais os Irmãos Marx são, invariavelmente, clandestinos a bordo.
Agora, quem quiser fazer um "tour" deslavadamente turístico, mesmo que seja através dos cenários dos estúdios de Hollywood, deve se lembrar de "A Volta ao Mundo em 80 Dias" (1956), de Michael Anderson –no filme, viaja-se de balão e trem, mas também de navio. E quem preferir um "tour" pela grande arte de Federico Fellini e pelos estúdios de Cinecittà deve reservar um lugar a bordo do Gloria N., o navio que faz um cruzeiro fúnebre em "E la Nave Và" (1983). Depois de ver o filme e entender o quanto são infinitos os limites da criação, pode naufragar em paz...

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