São Paulo, domingo, 10 de abril de 1994
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Cláusula social divide ricos e pobres no Gatt

ANDRÉ LAHÓZ
DE PARIS

Começa nesta terça-feira em Marrakech um encontro dos representantes dos 121 países que fazem parte do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (Gatt, em inglês). Na sexta-feira, último dia do encontro, deve ocorrer a assinatura do documento com os resultados da Rodada Uruguai.
Esse acordo está sendo qualificado como a mais ambiciosa negociação comercial da história. Analistas do Gatt prevêem uma redução de cerca de 40% nas tarifas de importação de bens industrializados, provavelmente a vigorar a partir de 1995.
Para se chegar à assinatura do documento, foram necessários sete anos de negociações entre os países. Várias vezes a Rodada Uruguai foi dada como morta.
O acordo foi selado no dia 15 de dezembro em Genebra, na Suíça. Mas de lá para cá vários atritos entre os membros ameaçaram a assinatura formal.
Os discursos endureceram por uma série de motivos. Em primeiro lugar, pelo uso, por parte dos Estados Unidos, da "super 301", seção da lei comercial norte-americana que permite ao país decretar represálias unilaterais contra aqueles que não agem de acordo com seus interesses.
A "super 301" é qualificada como sendo tudo aquilo que se quer eliminar das práticas comerciais. O Gatt existe exatamente para evitar que a lei do mais forte impere. Isso é particularmente importante para países como o Brasil, com poder mínimo de represália.
O Japão também foi criticado pela sua participação no acordo. A redução nas tarifas de importação japonesas foi considerada pequena.
Mas o maior problema desses últimos dias foi mesmo relativo à cláusula social. Os países ricos (principalmente os EUA e a França) acusam os países do 3º Mundo de se valerem de mão-de-obra barata para vender seus produtos.
O Brasil é citado em vários jornais nas comparações entre os salários dos diferentes países. Segundo o Departamento de Trabalho dos EUA, a indústria brasileira paga salários de US$ 3 por hora. A França, o Japão e os EUA pagam cerca de US$ 15 e a Alemanha, US$ 24 por hora. Ou seja, haveria uma "competição desleal".
A idéia inicial seria controlar apenas os casos extremos: trabalho de menores, trabalho forçado ou países sem direitos à organização sindical.
Os países em desenvolvimento se opõem fortemente a esse tipo de controle. O medo é que se comece por casos extremos e acabe caindo em protecionismo para os bens produzidos nos países ricos.
"Se os salários não fossem mais baixos, por que algum estrangeiro investiria na Índia?", pergunta o ministro do comércio indiano, Pranab Mukerjee.
Os países em desenvolvimento argumentam também que o Gatt não é o lugar para discutir situação do trabalho.
Nessa quinta-feira, o diretor geral do Gatt, Peter Sutherland, informou que os países ricos concordaram em não incluir a cláusula social no texto que será assinado em Marrakech.
Mas a questão continua viva. Ela certamente será citada em boa parte dos discursos no Marrocos.
Além disso, já está acertado que o debate continuará na OMC (Organização Mundial do Comércio), a entidade que deve substituir o Gatt a partir de janeiro de 1995.

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