São Paulo, quarta-feira, de dezembro de
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Bons antecedentes

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Preocupado com a cidadania, a fome e o desemprego, o sociólogo Betinho declara que o seu envolvimento no escândalo do bicho está superado. É uma decisão unilateral. Mais do que ninguém, ele é quem deve dar explicações, pois não se trata de um corrompido nem de um corruptor. Não pediu nem recebeu dinheiro para si, mas para uma causa humanitária.
Bem verdade que o "Jornal do Brasil", que não tem nada contra ele, antes pelo contrário, publicou página inteira sobre a Abia (acho que o nome é esse ou parecido). Na época da humanitária ajuda do bicho à humanitária causa da associação, as coisas estavam complicadas para a Abia: parecia uma dessas entidades que lavam dinheiro dos anões do Orçamento.
Fato mais estranho é o dinheiro ter sido depositado no exterior. A doação saiu do bicho, passou pela mão de Nilo Batista, passou pela mão de Betinho –que apesar de suas seráficas virtudes ainda não tem o poder sobrenatural de transformar pedras em pão nem dinheiro sujo em dinheiro limpo–, passou pelo presidente da entidade na época (já falecido) e foi parar em Nova York, meta final ou intermediária do dinheiro da droga e da corrupção.
Justamente porque Betinho paira acima dos mil acidentes da carne, ele poderia explicar como essas coisas se processam. Grosso modo (e bota grosso nisso), as pessoas envolvidas, lá e cá, corrompendo ou sendo corrompida, são suspeitas e têm mais ou menos aquilo que as fichas policiais englobam no conceito de "maus antecedentes".
Betinho tem bons antecedentes, boníssimos, santíssimos, sacratíssimos, é a encarnação de Irmã Dulce, de Mãe-Menininha, do Padim Ciço, de todos os santos do panteão popular. Por isso mesmo ele não pode considerar superado um assunto que nem começou.
Quem trabalha em mídia sente o cheiro do patrulhamento a quilômetros de distância. Não se deve falar no caso do Betinho, a não ser para louvá-lo por estar acabando com a fome e o desemprego. Não sei como deixaram publicar aquela história dos mendigos de Recife catando carne humana para comer. Foi um vacilo no patrulhamento.

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