São Paulo, domingo, 24 de abril de 1994
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Década vai da figura ao mórbido

Década vai da pintura ao mórbido
A Bienal de Veneza de 1980, organizada pelo crítico italiano Achille Bonito Oliva, serve de marco inicial para um "novo momento" da arte. Um momento que o próprio Bonito Oliva ajuda muito a inventar e que denomina de transvanguarda.
Essa invenção faz parte de um movimento maior, que inclui simultaneamente uma "nova figuração" (um novo figurativismo contra os rigores da arte abstrata), o neo-expressionismo na Alemanha e o culto da "má pintura" (mais espontânea e sem apuro técnico) e dos grafites, nos EUA.
O termo transvanguarda traz o sentido dessa rebeldia contra os cânones da modernidade, o ascetismo abstrato e o apuro intelectual da arte conceitual e minimalista.
Onde a arte moderna impunha a idéia de vanguarda, os novos artistas propõe um retorno à tradição anterior aos movimentos de vanguarda e às principais diretrizes da arte moderna, que havia chegado a impasses na busca incessante do novo.
O novo (o diferente) passa a ser o velho. A ruptura se faz não mais pela afirmação da ruptura mas, ironicamente, pela busca da tradição. A nova arte denuncia o que se tornou dogmatismo e academicismo nas vanguardas modernas.
A pintura é inicialmente a principal arma do movimento. Os novos artistas a usam como uma provocação. Queriam a volta do que havia sido decretado como morto pela geração anterior, a pintura. E, dentro dela, o que podia haver de mais impuro: o expressionismo, as figurações.
Como todo movimento generalizante, a nova produção inclui artistas de peso e outros cuja expectativa de vida teria a duração dos modismos.
Quando se fala da pintura do início dos anos 80, os principais nomes que vêm à cabeça são: Julian Schnabel e David Salle (EUA), Enzo Cucchi e Sandro Chia (Itália) e sobretudo Anselm Kiefer (Alemanha).
No decorrer da década, a "grande novidade" do retorno à tradição acaba sendo decantada dos exageros do marketing e da avidez do mercado.
Reaparece um diálogo com a arte conceitual e minimalista –e as instalações vão tomando o lugar atribuído à pintura, no início da década, pelo culto do mercado. Há nos EUA uma politização radical da arte (sob a influência da Aids e da militância das minorias sexuais e raciais).
A efemeridade dos movimentos generalizantes fica patente quando se vê o mesmo Bonito Oliva pontificando na última Bienal de Veneza (1993) que a nova arte nada tem a ver com a pintura pela qual tanto militou dez anos antes.
A chamada "arte mórbida" (cujos expoentes são os ingleses Marc Quinn e Damien Hirst) trabalha com instalações e esculturas, usando animais mortos e sangue, entre outros materiais orgânicos.

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