São Paulo, domingo, 24 de abril de 1994
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Arrastão tem nova coreografia

MARCELO TAS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Vivo na ponte aérea. Mas, por ordens médicas, moro em Ipanema. Em 89, fraturei os dois calcanhares e o ortopedista receitou: oito meses de caminhadas diárias, de 6 km, sobre areia fofa. Desde então, aqui fiquei ...
Continuo paulista, "paulista prá caramba: meu." Mas não há como negar que este é o bairro mais charmoso do país. O charme de Ipanema está em não precisar se esforçar para ser mais do que é. Ao contrário de outros bairros brasileiros, Ipanema não tem necessidade de imitar o Soho (bairro de Nova York), Candem Town (Londres) ou o Marais (Paris) para ficar bacana. Ser Ipanema já lhe basta.
Na geografia urbana e na poesia, Ipanema é o encontro do Leblon com Copacabana. É o lugar onde o Brasil-trombadinha se encontra com o Brasil-mauricinho. Onde o Brasil-Bélgica se encontra com o Brasil-Índia. Onde os bêbados de botequim tropeçam na mesma calçada que os bêbados de coluna social. Onde os bandidos furrecas do morro transitam pela mesma avenida que os bandidos de ar-condicionado e telefone celular.
Para quem só acredita no "Fantástico" e morre de medo do arrastão, vou informar. Ipanema é calma e tranquila como Poços de Caldas (aliás, Poços de Caldas ainda é calma e tranquila?). E tão segura quanto Higienópolis (é seguro caminhar por Higienópolis?).
O arrastão não nasceu em Ipanema. Quando adolescente, eu mesmo já promovi arrastão com meus colegas de colégio na cidade onde nasci, Ituverava (SP). Arrastão é molecagem, farra de turma na rua... É uma coisa tão antiga e infantil quanto o troca-troca. Ipanema apenas inventou um novo nome e uma nova coreografia, mais sofisticada.
E mesmo que o pessoal de antigamente insista com a ladainha de que "antigamente é que era legal, do balacobaco, etecétera e tal...", vou te contar um segredo: Ipanema continua o máximo. Sou testemunha ocular de que as meninas na areia continuam um "estouro". E de que tem dias que as correntes marinhas deixam as águas do Posto 9 claras e azuis (ou verdes) como as dos postais de Fernando de Noronha.
Ipanema reúne o melhor dos dois mundos. Aquela variedade urbana, agito 24 horas, típica de São Paulo. Com o melhor da cultura funk-tropical brasileira. É como morar em São Paulo, na alameda Jaú. E ter o Oceano Atlântico a seus pés, na avenida Paulista.

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