São Paulo, domingo, 24 de abril de 1994
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PMDB aposta no Colégio Eleitoral

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Tancredo Neves e Ulysses Guimarães se encontraram em Porto Alegre, quando a campanha pelas diretas mal estava com suas turbinas aquecidas.
É dia 12 de janeiro de 1984, pouco depois de participarem de um comício em Curitiba e de uma manifestação em Camburiu (SC).
Ulysses, naquela noite, comenta com Renato Archer (atual presidente da Embratel) e com José Aparecido de Oliveira (hoje embaixador em Portugal):
"O Tancredo me disse que, não saindo as diretas, disputará a Presidência pelo Colégio Eleitoral".
E Ulysses, meio assustado, prossegue: "Ele disse ainda que é uma questão de honra, para não deixar o Maluf participe do processo sozinho".
Naquele momento, Ulysses está francamente pessimista quanto ao sucesso da alternativa. Afirma que, dando o Colégio Eleitoral, Maluf poderia cooptar votos peemedebistas.
Assim, é óbvio que, para o PMDB, a mobilização popular é uma faca de dois gumes, também usada para viabilizar um dos seus no pleito indireto.
A Folha apurou que a questão já era discretamente discutida entre os peemedebistas de São Paulo, antes mesmo do ato público de 15 de abril, no Anhangabaú.
Há o caso, por exemplo, de uma reunião a portas fechadas, no gabinete do então governador Franco Montoro.
O presidente regional do PMDB, Fernando Henrique Cardoso, e o secretário de Governo, Roberto Gusmão, fazem ponderações emblemáticas.
Argumentaram, no início de abril, que a organização de um novo comício radicalizará o confronto com o governo e deixará o presidente Figueiredo sem alternativas para negociar um desfecho para a crise.
O comício acabou saindo porque os diretórios peemedebistas temem perder espaço para o PT, que pressiona, no Comitê Suprapartidário Pró-Diretas, pela volta às ruas da população.
A lógica vem de bem antes. Um grupo de peemedebistas, entre eles Ulysses, é convidado para assistir, em dezembro de 1983, a posse do presidente Raul Alfonsin.
Ulysses então confidencia a dois de seus acompanhantes, no bar do hotel em que estavam hospedados, em Buenos Aires:
"A campanha pelas diretas tende a crescer. Se ela for vitoriosa, sou o candidato à Presidência. Mas se for mantido o Colégio Eleitoral, o candidato será o Tancredo".
Tancredo Neves é considerado, naquele momento, como o mais moderado dirigente da oposição.
Pode cindir o PDS, o partido do governo, e comprometer a candidatura presidencial de Maluf.
É o que efetivamente acontece, mas segundo um roteiro acidentado que comprova que, para muitos, a campanha pelas diretas não se limita à aprovação da emenda Dante de Oliveira.
Na noite de 15 de abril, enquanto o Anhangabaú está apinhado de gente durante o terceiro e maior comício organizado em São Paulo, Figueiredo anuncia, em cadeia de rádio e TV, emenda constitucional que adia as diretas para 1988.
É a chamada "emenda Leitão" (Leitão de Abreu é o ministro-chefe do Gabinete Civil), que imobiliza setores do próprio governo que tendem a votar em favor das diretas-já.
Entre os hesitantes está o vice-presidente da República, Aureliano Chaves.
Aureliano reage de maneira esperada. Diz que as diretas são uma questão consensual e que a emenda do governo representa uma base para negociação.
O peemedebista Tancredo Neves reage de maneira parecida. Se a Dante de Oliveira não passar, afirma ele, "a emenda é um ponto de partida para o entendimento".
Sua declaração é feita na tarde de 16 de abril, nove dias antes da votação da emenda Dante, e representa um sinal suplementar de que o PMDB já raciocina com a hipótese de derrota das diretas.
Uma derrota entre aspas. A campanha dá ao grupo de Tancredo o cacife necessário para destruir a vantagem pró-Maluf no Colégio Eleitoral.(João Batista Natali)

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