São Paulo, sábado, 30 de abril de 1994
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Extremistas ameaçam com guerra civil

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL

"A guerra na Bósnia parecerá insignificante comparada com a guerra civil que haverá aqui se tentarem desarmar os fazendeiros brancos."
O sinistro aviso vem do sargento-major do Exército Obie du Plessis, presidente da Frente da Liberdade na cidade de Hoopstad, um reduto branco no Estado Livre de Orange.
Detalhe fundamental: a Frente da Liberdade, de que Du Plessis faz parte, participa das eleições e, portanto, pode ser considerada a mais moderada entre as organizações da extrema direita.
Se é assim entre os moderados, entre os duros é evidentemente muito pior.
Tome-se o caso de Ventersdorp, 200 km a oeste de Johannesburgo, uma das 14 cidades declaradas pelo governo "áreas de turbulência", estágio suave do estado de emergência.
Em Ventersdorp, a nova e a velha África do Sul são vizinhas. Na delegacia de polícia, a nova bandeira de seis cores está hasteada no mastro e o juiz David Postman acabou de concluir a contagem dos votos.
Votaram exatamente 17.532 pessoas, quando Postman acreditava que o eleitorado não passava de 15 mil.
Na quadra seguinte, sacos de areia no muro, homens armados à porta e o aviso "Unidade de Resposta Armada - Serviço 24 horas" indicam a sede local do AWB (Afrikaner Weerstandsbeweging ou Movimento de Resistência Africâner).
Um cartaz avisa, em inglês e em africâner (o idioma dos descendentes dos colonizadores holandeses): "Imprensa não é permitida".
Um homem de uniforme cáqui, os nós dos dedos feridos, chapéu também militar, grita: "Fotos não".
Informações também não, só com Fred Rundle, o porta-voz do AWB, que está em Johannesburgo.
Quando vê, no peito do repórter da Folha, a credencial do CNA, o homem se recusa a continuar conversando e volta para o bunker.
Atrás dos sacos de areia, só se vê os olhos do vigia, rosto coberto pelo gorro. Na porta, esculpida em arame, a águia, símbolo desse grupo neonazista.
O juiz Postman diz que eles são poucos, não mais de 30 em uma população branca de mais ou menos 2.000 pessoas.
Nem por isso deixam de cultuar seus heróis. Em frente à delegacia, um pequeno monumento em granito negro é um minirrelicário do neonazismo: o outro símbolo do AWB, uma espécie de suástica partida ao meio –a inscrição "Wenkommando" ("Comando Vencer"), a unidade de elite– e os nomes dos três homens do comando que morreram em 1991, em distúrbios durante visita de De Klerk.
O AWB ameaçou também impedir a eleição em Ventersdorp. Sem êxito: "Tudo correu bem, sem problemas", atesta o juiz Postman.
(CR).

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