São Paulo, sábado, 30 de abril de 1994
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Banco Central autônomo

FERNANDO DE HOLANDA BARBOSA

Nos últimos 45 anos o Brasil teve oito padrões monetários. A morte anunciada do cruzeiro real dará lugar ao nascimento do real, que será a nona moeda neste curto espaço de tempo.
Esta tradição de troca frequente revela, de um lado, o desprezo da nossa sociedade com uma instituição básica em qualquer país, a moeda, e, de outro lado, a insensibilidade das elites que dirigem o país ao usarem a moeda como um instrumento para taxar as camadas mais pobres da população.
O que o governo deverá fazer para que o real quebre esta tradição e o Brasil tenha finalmente um padrão monetário estável?
A estabilidade da moeda depende fundamentalmente de uma ruptura do atual regime monetário-fiscal, em que o Banco Central não tem condições de controlar a política monetária.
A opção ideal seria o Congresso fazer uma revisão da atual Constituição, pelo menos com uma agenda mínima que incluísse a reforma fiscal e a reforma da Previdência Social.
Estas reformas permitiriam ao Estado financiar seus gastos sem ter de recorrer à emissão de moeda. Infelizmente, esta estratégia fracassou, e a sociedade brasileira, através do Congresso, não tem demonstrado sensibilidade com a febre inflacionária, cuja temperatura já ultrapassou a taxa anual de 5.500%.
A opção que resta ao governo é impor a disciplina fiscal através de uma reforma monetária que impeça o Tesouro de se financiar de modo direto ou indireto através do Banco Central, concedendo à autoridade monetária autonomia de decisões na condução da política monetária para manter a estabilidade do real.
Algumas medidas necessárias para que isto ocorra são as seguintes: 1) proibir o Banco Central de comprar títulos do Tesouro; 2) proibir os bancos estatais (federais e estaduais) de financiarem órgãos públicos; e 3) proibir os bancos de carregarem carteira própria de títulos públicos. Com estas condições, o Tesouro só poderia se financiar através de impostos ou com a venda de títulos ao público não-bancário.
Em outros países que passaram por experiências semelhantes, a hiperinflação acabou da noite para o dia quando o Banco Central assumiu o comando da política monetária e a austeridade fiscal passou a ser um fato cotidiano na administração do Tesouro.
Este tipo de política não implica em recessão, como também demonstra a experiência de vários países, inclusive a da Argentina com o Plano Cavallo.
Portanto, para manter o real estável, o governo não terá de conter a economia, mas sim introduzir um conjunto abrangente de reformas na área monetária, que não permita que o real caia na vala comum das outras moedas, tendo algum dia de ser sepultado e renascer com outro nome para preservar o status quo daqueles que fazem da inflação um meio de vida. Oxalá, isto não ocorra!

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