São Paulo, domingo, 1 de maio de 1994
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Prioridade de todos é a reconstrução do Estado

CLÓVIS ROSSI; JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

"Houve crescimento, mas acompanhado de concentração de renda brutal"
Marco Aurélio Garcia (PT)
As críticas ao modelo econômico estão, quase todas, centradas na questão social. "Provocou crescimento, mas foi acompanhado de uma concentração de renda brutal", declara Marco Aurélio Garcia, coordenador do programa de governo do PT.
Para Antônio Kandir, doutor em economia, o modelo nacional-desenvolvimentista teve um filho político igualmente daninho. Depois de dizer que o modelo sempre beneficiou quem já tinha capital acumulado, Kandir afirma que as regiões Norte e Nordeste ficaram na periferia econômica.
"Mas conseguiram uma compensação política. As oligarquias se fortaleceram politicamente. Foi o preço que as elites do Centro-Sul pagaram, com muito gosto", diz.
Lideranças
A este problema estrutural, acrescentou-se outro, no período militar que foi de 1964 a 1985, pelo menos na visão de Jereissati. "O modelo político autoritário cometeu dois erros gravíssimos: acabou com os partidos políticos e cassou a possibilidade de surgimento de novas lideranças".
Luciano Martins concorda. "O nó do sistema político é a desestruturação partidária. Falta uma estrutura partidária que transforme demandas particulares em temas nacionais", analisa.
Além do sistema político, o outro lado do modelo que entrou em colapso, concordam todos, tanto à direita como à esquerda, foi o relativo ao desempenho do Estado.
Como afirma Luciano Martins, "uma das características centrais do modelo foi a tentativa de construir a nação tendo o Estado como demiurgo (o Deus que cria o universo, organizando a matéria previamente existente)".
Reconstrução
Kandir faz a ligação entre os dois fatores: culpa o sistema político distorcido pelo que chama de dilapidação do Estado.
A reconstrução do organismo estatal é tema prioritário de todos os partidos, embora o enfoque não seja, o mesmo para todos:
Fetter Júnior, presidente da Fundação Milton Campos e coordenador do programa do PPR, afirma que "a máquina estatal cresceu tanto que começou a ficar ineficiente".
O ex-presidente José Sarney, um dos pré-candidatos do PMDB, reforça a idéia, afirmando que "o Estado cumpriu, no modelo anterior, uma missão que só ele poderia executar. Mas, hoje, não tem mais sentido".
Flávio Rocha, do PL, prevê, com a implantação do Imposto Único, o vértice de seu programa, não só a realização de uma reforma tributária.
"O Imposto Único é muito mais amplo que isto. É uma revolução, propiciada pelas novas tecnologias, que vai mudar a relação do Estado com a sociedade. A primeira revolução foi a introdução da moeda, quando o Estado deixou de se apropriar de parte da propriedade e da produção como forma de tributar".
Passo
"O primeiro passo para qualquer governo será contornar a situação falimentar do Estado. Essa providência é indispensável quer se pretenda fazer uma política soviética ou uma política thatcherista", afirma Marco Aurélio Garcia.
A frase simbólica: indica que a questão do Estado precede qualquer outra, independentemente do rumo que se queira tomar. Se o rumo for tão liberal quanto o dado ao Reino Unido pela ex-premiê Margaret Thatcher, é preciso sanear.
Se o rumo for tão estatizante quanto o da falecida URSS, também é preciso sanear. A razão é simples. Como diz Quércia, "o Estado, fragilizado financeiramente, perdeu o poder de coordenação".
Assim, o país que vai às urnas em outubro/novembro herda modelo que tem, no mínimo, duas de suas principais pernas quebradas: Estado e sistema político.

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