São Paulo, domingo, 1 de maio de 1994
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URV virou dólar à vista

SAMIR DICHY

Organizar um "poolde importação" para alguns insumos pode representar uma saída
O mercado da construção civil, como os demais setores da economia, procura se adaptar à criação da URV (Unidade Real de Valor). A exemplo do ocorrido na edição dos planos de estabilização anteriores, a sociedade se assustou com as novas diretrizes econômicas e reagiu na defensiva. Resultado: os preços dispararam, os prazos de pagamento encurtaram e persistem dificuldades de negociação que precisam ser sanadas.
Nos últimos dez anos, principalmente, trabalhamos na instabilidade como verdadeiros equilibristas da corda bamba.
Poucos são os segmentos que respeitam "o pacto social e econômico" tão necessário e importante para debelarmos o avanço do processo inflacionário. No caso da construção civil, tentamos trabalhar as dificuldades. Desde que o Plano FHC foi para o Congresso, em dezembro do ano passado, as remarcações dos materiais se sucederam sob o critério da ganância, da "Lei de Gerson": leva vantagem quem pode mais.
O Sinduscon (Sindicato da Indústria da Construção Civil) atesta que, em São Paulo, os preços dos insumos estão sendo convertidos em URV, mas acima da variação média dos últimos quatro meses de 1993, conforme determina a lei. Isso sem falar nos chamados aumentos preventivos, que só nos dois primeiros meses de 1994 acumularam uma alta superior a 125% nos custos de determinados materiais.
É penoso constatar que agora, além da correção diária da moeda, os preços embutem também a expectativa de inflação. Ou seja: antes do Plano FHC era possível pagar os insumos em 30 ou 40 dias, certamente, com a projeção inflacionária. Atualmente, os fornecedores cortaram prazos de pagamento, converteram preços em URV, sem descontar a expectativa de inflação. A quitação da compra em dois cheques, tão comum, virou dólar à vista.
É inconcebível que alguns segmentos do empresariado brasileiro, notadamente os que estão à frente dos monopólios e oligopólios, continuem se comportando como autênticos representantes do Terceiro Mundo. É fato que falta ao governo contribuir um pouco mais na contenção da inflação, através de cortes efetivos da máquina estatal. Entretanto, esses setores têm minado, sem complacência, os sucessivos planos econômicos, ao alimentarem a cadeia inflacionária com a alta abusiva dos seus preços.
Organizar um "pool de importação" entre os empresários da construção civil, para alguns insumos, pode ser uma saída no nosso caso específico. Trata-se da única forma de justificarmos ganhos de escala nas compras externas, e enfrentarmos a alta descabida dos preços praticados no mercado interno pelos oligopólios. A iniciativa traria benefícios se aplicada em grandes quantidades. A formação do "pool" não atrapalharia a independência das empresas e, tampouco, a competitividade das mesmas. Trata-se, afinal, de uma alternativa para que não acumulemos mais perdas, caso os insumos do setor sofram reajustes superiores à inflação, como já vem ocorrendo em certos casos. Se os contratos das construtoras com seus clientes estão indexados à URV, podemos acumular prejuízos com o desrespeito à lei, que alguns segmentos insistem em praticar.

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