São Paulo, domingo, 1 de maio de 1994 |
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Instrumentalização do estudo filosófico é um decreto de morte
MILTON MEIRA DO NASCIMENTO
Vestibular Ou será que o reconhecimento da importância da filosofia não passa de um sentimento difuso que, com frequência, chega até ao Ministério da Educação e Cultura, o qual, por sua vez, não sabe como defini-lo, permanecendo, dessa forma, sem condições para tomar uma decisão seja pela obrigatoriedade total seja pela parcial do ensino da disciplina? Fascinação Essa é exatamente a minha impressão. Sem saber muito bem do que estão falando, todos elogiam a filosofia, acham lindos os cursos, pedem sua volta ao 2º grau, consideram inteligentes as conferências quando proferidas por professores de filosofia, os quais, muito modestamente, diz-se, não gostam de ser chamados de filósofos. Fascinação, encanto. Maravilha! Mas também muita confusão, leituras mal assimiladas, ostentação de muita sabedoria em cabeças ocas. Tudo isso é compreensível. Afinal de contas, a filosofia está completando, no Estado de São Paulo, 25 anos de ausência nos exames de ingresso nas universidades. Naqueles tempos, exigia-se, pelo menos dos alunos que a haviam escolhido como bacharelado, que conhecessem um pouco alguns textos básicos da tradição filosófica. Miragens Hoje, na névoa desses anos todos, não é de espantar que muitos vejam miragens. Espectros de estudantes e professores de filosofia rondam os poderes públicos exigindo seus direitos. A filosofia deve voltar ao 2º grau. Deve estar no exame vestibular, no primeiro grau e na pré-escola. Deve fazer parte dos currículos de humanidades nas universidades. Outros vão mais longe ainda e consideram fundamental que os filósofos estejam presentes nos hospitais, nas empresas, nos sindicatos, nos gabinetes dos ministros, no palácio do Planalto como conselheiros do Presidente e na seleção brasileira. Exagero? Nem tanto. Afinal de contas, nos EUA as coisas já se passam assim. A exigência da volta da filosofia às escolas vem acompanhada da necessidade de sua instrumentalização, da necessidade da afirmação de sua utilidade. Longe de constituir-se como saber desinteressado, ela deve dizer a que vem, a serviço de quê, para ocupar o lugar de quem, para resolver quais problemas. Consciência A instrumentalização da filosofia é a decretação de sua morte. Ela deve voltar com pessoal preparado para ministrá-la bem, com material didático e paradidático de boa qualidade. E, principalmente, amparada por uma vasta cultura de humanidades. Pois não é possível estudar e fazer filosofia sem, ao mesmo tempo, estar em contato com as artes, a literatura e as ciências humanas. Aliás, já está na hora de pensarmos no retorno da cultura clássica humanística. Quem sabe se, depois da filosofia, alguém se lembre também do grego e do latim... Texto Anterior: JOSÉ ARTHUR GIANNOTTI Próximo Texto: AS PAIXÕES POLÍTICAS Índice |
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