São Paulo, domingo, 1 de maio de 1994
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Irlanda vive onda de violência protestante

SÉRGIO MALBERGIER
ENVIADO ESPECIAL À IRLANDA DO NORTE

Com o aumento das iniciativas de paz para o conflito entre católicos e protestantes na Irlanda do Norte, cresceu também a violência de grupos paramilitares protestantes contra a minoria católica (pouco mais de 40% da população).
Os grupos paramilitares católicos reagiram, causando uma espiral de violência que deixou nove mortos em oito dias terminados na última quinta. A polícia acha que a violência ainda pode aumentar.
Os grupos protestantes são conhecidos como "unionistas" e querem manter a Irlanda do Norte dentro do Reino Unido.
Seus ataques e assassinatos este ano já ultrapassam os cometidos pelo IRA (Exército Republicano Irlandês, católico, que luta pelo fim do domínio britânico e pela união da Irlanda do Norte com a católica República da Irlanda).
Segundo Terry Houston, porta-voz da polícia em Belfast, os unionistas "não têm cultura ou ideologia forte como o IRA" e costumam atacar católicos aleatoriamente, enquanto o IRA quase sempre tem como alvo membros ou pessoas ligadas ao governo britânico e seu aparato de segurança.
Enquanto o IRA tem uma estrutura militar rígida, com brigadas e batalhões, os unionistas são menos organizados e disciplinados.
Houston avalia que o IRA precisa de cerca de US$ 10 milhões por ano para financiar suas atividades, enquanto os unionistas gastariam US$ 4 milhões.
A maior parte do dinheiro vem de esquemas de extorsão parecidos com os do crime organizado, roubos e falsificação.
No caso do IRA, há também significativa contribuição da influente comunidade irlandesa nos Estados Unidos.
A polícia diz que o IRA recebe dinheiro de traficantes de drogas, por permitir que eles atuem em regiões católicas de Belfast. A organização nega veementemente.
O IRA alega que mantém os traficantes e ladrões fora das áreas sob seu domínio.
O aumento da violência dos grupos paramilitares protestantes coloca pressão para que o IRA reaja.
Alguns católicos enxergam o grupo terrorista como seu protetor natural contra os unionistas, enquanto outros acham que o IRA é culpado por incentivar a violência.
O IRA historicamente se recusa a entrar num esquema de revanchismo automático para, segundo Houston, evitar espiral da violência de consequências imprevisíveis. As mortes da semana passada parecem indicar esta tendência.
Para o deputado protestante William Ross, do Partido Unionista do Ulster, os unionistas aumentaram seus ataques porque eles "se sentem traídos" pelo governo britânico, principalmente após a iniciativa de paz de dezembro passado pelo premiê britânico, John Major, e pelo presidente da República da Irlanda, Albert Reynolds.
A iniciativa prevê que qualquer solução para o conflito da Irlanda do Norte seja aprovada em referendo pela população da região, o que garantiria a manutenção do status atual devido à maioria de cerca de 60% de protestantes.
O que mais desagradou os unionistas foi a disposição de Londres de negociar e dar mais poder à República da Irlanda.
Mas pesquisas de opinião mostram que a maioria a favor da manutenção da Irlanda do Norte como parte do Reino Unido pode chegar a 80%, devido ao grande número de católicos (principalmente entre a classe média) que preferem manter os quase US$ 10 bilhões de investimentos anuais do governo britânico.

O jornalista SERGIO MALBERGIER viajou a convite do governo britânico.

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