São Paulo, quinta-feira, 5 de maio de 1994
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O caminho da solução

LUIZ ANTÔNIO DE MEDEIROS

O fracasso da revisão constitucional impõe a necessidade de buscarmos, com urgência, alternativas para evitar o caos e garantir a governabilidade do país. Ninguém –nem mesmo os que desde o início se opuseram à revisão constitucional– é ingênuo o suficiente, ou mesmo ignorante, para acreditar que, sem a revisão, o Brasil poderá encontrar a solução dos graves problemas políticos, econômicos e sociais que emperram nosso desenvolvimento.
O colapso da capacidade de investimento do Estado nas áreas sociais vitais, como saúde, educação, segurança e infra-estrutura; a falência da Previdência Social, que não consegue sequer pagar decentemente os milhões de aposentados; a falta de investimentos produtivos por parte dos capitais nacional e estrangeiro; a anarquia fiscal e tributária que desestimula a produção e engorda a sonegação; a confusão orçamentária da União, Estados e municípios são apenas alguns exemplos da amplitude dos problemas que, sem revisão, não terão solução e comprometem a governabilidade, seja quem for o próximo presidente da República.
Por isso, é desolador observar que a revisão constitucional fracassou –não pelo boicote dos "contras", as minorias ultrapassadas que se recusam a pensar no país do futuro.
A revisão fracassou pela irresponsabilidade da parcela majoritária de nossas elites e, principalmente, pela inércia, igualmente irresponsável, do núcleo que tem comandado o governo federal.
Ambos não souberam enxergar a grandeza do momento e a excelente oportunidade que o país teria para remover da Constituição as monstruosidades que a desfiguram.
Menos pela intransigência das minorias e mais pela mesquinhez e falta de patriotismo de nossas lideranças políticas, assim como pela falta de união do empresariado, o fracasso da revisão constitucional mantém o país refém do passado e do atraso.
Mas a situação não pode ficar do jeito que está. Os homens responsáveis deste país não podem se conformar com esta perversão, segundo a qual a maioria da sociedade, que deseja e exige as reformas, se submete à vontade de anões que não estão à altura do mandato que lhes foi conferido e da grandiosa tarefa que lhes foi imposta.
É por isso que apoiamos, com entusiasmo, a sugestão desta Folha para que se convoque uma assembléia revisora exclusiva, com o objetivo de fazer o que este Congresso não teve coragem de fazer.
Em seu patriótico editorial de quinta-feira passada, a Folha admite que a "tese é ousada e as dificuldades, gigantescas". Mas acreditamos, como sugere o editorial, que, se houver vontade, a proposta não é irrealizável. Nós, que lutamos pela revisão constitucional, já saímos a campo para nos juntar à sociedade e tornar viável esta proposta.
Há quem argumente que a eleição de colégio de cidadãos escolhidos exclusivamente para fazer a revisão da Carta poderia privar o Congresso Nacional de seus melhores quadros, já que a assembléia revisora seria dissolvida tão logo se encerrassem os trabalhos. Não concordamos com esta idéia.
Há, em todos os cantos do país, brasileiros competentes e honrados que não querem ou não podem, por inúmeras razões, disputar um mandato de deputado federal ou senador, mas poderiam prestar uma grande contribuição ao país disputando uma vaga no colégio revisor.
Antecipando as desculpas pelas inevitáveis omissões, poderíamos citar, como exemplo, alguns nomes ilustres, aqui do Estado de São Paulo, que dificilmente aceitariam disputar um mandato de deputado ou senador, mas certamente não recusariam o patriótico desafio de disputar uma vaga para o colégio revisor.
Nomes como o médico Adib Jatene, os juristas Ives Gandra Martins, Saulo Ramos e Miguel Reale, o professor José Goldemberg, o cientista político Leôncio Martins Rodrigues, o economista José Pastore, o empresário Osires Silva, o homem da cultura José Mindlin, o publicitário Flávio Corrêa, a escritora e acadêmica Lygia Fagundes Telles, lideranças do mundo do trabalho e uma infinidade de outros nomes.
Para vencer os naturais obstáculos a esta proposta ousada, porém factível, os brasileiros contam com o apoio de grandes juristas que ensinariam o caminho das pedras. Restaria aos políticos de bem –governadores, prefeitos, parlamentares– buscar as formas de negociação para tornar viável a assembléia revisora exclusiva.
Oxalá possamos ter, enfim, uma nova Constituição. Uma Constituição enxuta e capaz de atender aos anseios de nosso povo e às necessidades de um Brasil contemporâneo e integrado internacionalmente.

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