São Paulo, sábado, 7 de maio de 1994
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Fãs fazem homenagem silenciosa no cemitério

MAURO TAGLIAFERRI
DA REPORTAGEM LOCAL

Silêncio e tristeza. A reação de cada pessoa que se aproximava da sepultura do piloto Ayrton Senna ontem durante todo o dia era invariável: quietude e comoção.
Logo ao entrar no cemitério do Morumbi, na região oeste de São Paulo, avista-se, no centro do gramado onde estão os jazigos, um morro de flores.
Na verdade, uma pequena montanha de 1,8 m de altura formada por flores, bilhetes, bandeiras brasileiras e fotografias do piloto cobre o jazigo 11 do setor 7 da quadra 15, onde Senna foi sepultado.
Ao redor, surgem os personagens. Durante o dia de ontem, cerca de 3.000 pessoas, segundo a administração do cemitério, visitaram o túmulo.
Foi o primeiro dia de visitação pública. Anteontem, durante o enterro, o cemitério foi fechado.
O primeiro a chegar, às 7h20, foi Carlos Eduardo Zuffo, 24. Prometeu que ficaria até o fim do dia, enrolado na bandeira nacional e com o uniforme da equipe Williams, pela qual Senna corria.
Cumpriu a promessa e permaneceu lá até às 18h, quando o cemitério fechou.
Zuffo viu quando chegaram as crianças da Escolinha Lar Casa Humilde, uma creche localizada na favela Paraisópolis, também na região oeste da cidade.
Segundo a dona da creche, Maria José Clemente, Ayrton Senna ajudava a manter a instituição. Doou alimentos, camisetas e alguns utensílios, como talheres.
O contato da creche com o piloto foi através do "Xou da Xuxa", no final dos anos 80. As crianças tinham ido à gravação do programa e Clemente pediu ajuda a Senna, que namorava a apresentadora.
No cemitério, as crianças pareciam estar sem graça. Timidamente, ensaiaram o coro "olê, olá, Senna, Senna". Uma delas, Fabiana, 11, não parava de chorar.
"Ele era muita coisa para mim, não sei explicar", disse a menina. Momentos depois, as crianças se deram as mãos e rezaram.
"Estou rezando para a Elis Regina ajudar o Senna, pois ela está "lá" há mais tempo", disse o comerciante Cláudio Luís Pereira, 30. A cantora Elis Regina, morta em 1982, está enterrada no mesmo cemitério de Senna.
"Parecia que anteontem foi "o dia em que a Terra parou"", afirmou Pereira, citando música de Raul Seixas, também morto, para explicar como foi o cortejo.
"Não havia ladrões, os motoristas largavam seus carros abertos para ver o corpo passar, tudo em silêncio", resumiu o comerciante.
Distante dali, varrendo o chão, um dos personagens principais do enterro sumia novamente no anonimato. Narciso Moreira da Silva, 25, era um dos coveiros que ajudou no sepultamento de Senna.
"Foi um momento ruim", disse Silva, o mesmo sobrenome de Ayrton Senna. "Ninguém esperava o que aconteceu", concluiu.

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