São Paulo, sábado, 7 de maio de 1994
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Os antiatentados dos pombos da paz

PAUL SINGER

Para que se faça realmente paz entre estes dois povos será necessário superar décadas de ódio e derramamento de sangue e inaugurar um relacionamento cooperativo e de mútuo respeito. Talvez seja otimismo excessivo imaginar que o acordo recentemente concluído entre Israel e a OLP venha a permitir isso.
Mas, este acordo era tão improvável há uns poucos meses e foi torpedeado por massacres tão horripilantes que a sua concretização parece um milagre e por isso confere ao otimismo um toque "realista" inegável. Da mesma forma que o inesperado e improvável fim do apartheid na África do Sul, agora coroado por eleições democráticas, o acordo recém-assinado constitui uma prova de que povos e etnias são capazes de definir racionalmente seus melhores interesses e agir em consequência.
O fato fundamental é que tanto palestinos quanto israelenses estão profundamente divididos perante a questão da paz. De ambos os lados, não são poucos os que querem a continuação do conflito, seja porque têm esperança de vencê-lo, seja porque não confiam no "inimigo" e suspeitam que ele trairá o acordo na primeira oportunidade.
Os "falcões" dos dois lados usam a mesma tática para destruir o acordo: cometem atentados contra a população civil contando com o revide do outro lado para aprofundar o ódio e assim "provar" que a paz é impossível. Os terroristas árabes e judeus são objetivamente aliados, pois se ajudam mutuamente, cada um fornecendo ao outro farta motivação para prosseguir na sanha assassina.
Mas, o caminho da luta fraticida leva a parte alguma. Não há qualquer possibilidade de que israelenses ou palestinos alcancem uma vitória definitiva. Sequer o genocídio resolve, pois sempre há sobreviventes sedentos para continuar a luta, como o inolvidável Holocausto perpetrado por Hitler demonstrou. A sua "Solução Final" não passou de um episódio horrendo, que até mesmo os anti-semitas negam e portanto renegam.
O acordo, aparentemente tão frágil, mostra que a maioria dos palestinos e árabes acabou se convencendo de que o conflito não apresenta outra perspectiva que a sua sangrenta continuação, geração após geração. E por isso, a maioria dos dois lados teve a coragem e sabedoria de optar pela paz.
Os "pombos" israelenses e palestinos também são aliados objetivos, apesar de todas as diferenças de interesses e concepções que os separam. A cada antiatentado que cometem, soltando prisioneiros, evacuando tropas, fechando acordos e estabelecendo relações mutuamente vantajosas, ódios e ressentimentos são enfraquecidos e sentimentos mais generosos têm chance de frutificar.
Podemos ser otimistas, mas não ingênuos. Falta muito para que a conquista da paz seja definitiva. Os inconformados ainda vão matar gente inocente e chamar de traidores os que optarem pela convivência pacífica. Mas, no final, a racionalidade e o auto-interesse impor-se-ão.
Palestinos e israelenses –e também o resto do mundo– têm tanto a ganhar com a paz em termos econômicos, políticos e culturais, que dá para responder afirmativamente à pergunta: a opção pela paz agora acabará por prevalecer.

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