São Paulo, quinta-feira, 19 de maio de 1994
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TRECHO

Ele entrou atravessando a porta verde, de chapa de aço ondulado, e colocou um disco do homem cujo mode de tocar ele havia ouvido pela primeira vez dois dias antes. O homem tocava "Night in Tunísia" e a teia de notas tomou o lugar da teia de orvalho que afligia o topo de sua cabeça. As notas subiram e desceram dispersando o mundo ao seu redor, traçando uma série de arcos que pareciam apontar para um lugar, ou se não um lugar, um estado de espírito. Ele fechou os olhos deixando que a música o preeenchesse e tentou ver aquele lugar. Conseguia ver uma paisagem de pequenas colinas, se estendendo até o infinito, inundada de uma luz amarela que parecia verter em jorros como água. Ele decidiu que esse era um lugar em que sempre se estava, embora se estivesse o tempo todo tentando alcançar, em direção ao qual sempre se andava , embora nunca se pudesse chegar, como se estivesse eternamente um pouco para além. Abriu os olhos e imaginou onde as Tunísia ficaria no atlas. Daí parou de imaginar, caminhou até o piano, pegou o saxofone e o colocou sobre a mesa. Abriu o estojo e viu o instrumento reluzindo sob a luz, novo e jamais tocado. Ele sabia que estava acordando seu pai daquele que era o sono de toda a sua vida, mas não se importou, imaginando qual não seria o prazer dele

Extraído de "Night in Tunisia", tradução de Nicolau Sevcenko

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