São Paulo, quinta-feira, 19 de maio de 1994
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Infinito enquanto dure

O ministro da Fazenda, Rubens Ricupero, viaja pelo país, respondendo a dúvidas e até inaugurando um novo estilo. Fala do câmbio "estável" (para não dizer congelado), citando um poema de Vinícius de Moraes: o câmbio fixo não será imortal, "posto que é chama", mas terá a propriedade do amor de ser "infinito, enquanto dure".
Outras iniciativas do governo, entretanto, vão revelando semelhanças não com poemas de Vinícius, mas com a volatilidade amorosa que se atribui ao "poetinha".
Assim, depois de o assessor especial José Milton Dallari anunciar um acordo entre proprietários e inquilinos quanto à conversão dos aluguéis à URV, veio o presidente da República desautorizar o que anunciara o técnico. O ministro atalhou depois que a proposta era apenas uma entre muitas, divulgada erroneamente pela imprensa.
Exemplo também inquietante é a intenção anunciada de reduzir alíquotas de impostos financeiros, como o IOF e o IPMF. Fala-se também em subsídios aos exportadores a partir de julho. Ou ainda na manutenção da Ufir como proteção à arrecadação caso a inflação, em real, ultrapasse as expectativas.
Nesses casos, a pretexto de prolongar ao máximo a "eternidade" do câmbio fixo, vai-se aumentar a arbitrariedade e casuísmo do sistema tributário. Se a previsão, com inflação baixa, é cair a arrecadação de IOF e IPMF, qual a lógica de se reduzir alíquotas? Melhor seria simplesmente eliminar essas taxas.
E se a perspectiva é de queda na arrecadação, até que ponto poderá chegar a concessão de subsídios? Mais ainda, como justificar que se preserve a indexação dos impostos, mantendo a Ufir, e ao mesmo tempo cobrar de toda a sociedade a desindexação de salários e contratos?
É compreensível que o ministro da Fazenda se mostre enamorado do plano sob sua responsabilidade. É verdade que o amor é cego, mas é lamentável que em nome dessa paixão tornem-se cada vez menos transparentes os critérios de condução da política econômica.

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