São Paulo, domingo, 22 de maio de 1994
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O plano Geléia Real

RICARDO SEMLER

Na época, o assunto era batatas fritas. Fui falar com o coronel Ezil Veiga da Secretaria Especial de Informática. Na gestão de seu antecessor eu já tinha sido informado de que nosso fritador de batatas era um equipamento de segurança nacional. É isto mesmo. O fritador continha um microprocessador, portanto era um computador, portanto caía no âmbito da Lei de Informática, portanto não podia ser produzido sem o de acordo dos militares a SEI.
Na gestão do coronel Ezil, o bom senso voltou a ocupar um espaço digno. Nestes dias recebi uma carta do mesmo, lamentando, em razão do meu último artigo, a falta de perspectiva. Pediu que eu usasse a próxima coluna para uma injeção qualquer de otimismo.
Bem, bem, bem. Estou otimista. Aliás, sempre acreditei que as coisas tomariam um rumo bom, era só questão de tempo. Hoje, o plano da Geléia Real, que traz na apicultura a característica de injetar por curto prazo de tempo uma adrenalina no sistema, vai surtir efeito. Estelionato eleitoral? Talvez, se acharmos que o êxito de uma iniciativa econômica, que resulte numa vitória eleitoreira, é roubo de votos. Mas roubo de quem?
Diz o ministro Ricupero que o PSDB é o que os gringos chamam de "closet gay", e que o partido precisa sair do armário. Protestos da comunidade gay à parte, não há porque esconder que o PSDB é um partido de centro, com leves ares de esquerda, e um pragmatismo que leva o preto em direção ao branco, com grande ocupação do cinza. Mas a social-democracia está ficando mais idosa no mundo, e com isto mais conservadora, querendo pôr fim ao idealismo puro que a mantém fora do poder.
Pode-se discutir se o PFL é atrasado e conservador, com líderes que representam o que há de mais anacrônico no país? Não. Há dúvida em relação ao Sarney, este que cometeu um estelionato eleitoral sem ter a competência para faturar em cima, e que faz barganhas mesquinhas em troca de apoio? Também não.
Por outro lado, não resta dúvida de que o PSDB, sozinho, não leva nada. Não tem tempo na TV (dois minutos por dia contra um do Enéas) e não tem formação suficiente de diretórios em pequenas cidades pelo país afora. Querendo ganhar alguma coisa, precisa fazer alianças. Se ganhar, como parece bastante possível, novas alianças serão feitas para governar, e não necessariamente com os mesmos partidos que participaram da chapa. Política elementar, meu caro Watson.
Então, coronel, a coisa parece boa, sim. O Fernando Henrique chega ao segundo turno, Lula vai perdendo força e acaba demonstrando o que ele realmente é: um bravo e honesto ideólogo, com uma carreira espetacular e uma vontade real de ser estadista, sem contudo ter tido oportunidade de se preparar para um cargo deste tamanho.
Sua vez deverá chegar, merece. O FH se preparou a vida toda. E hoje precisa meter o pau no Lula, a contragosto –a polarização dos dois é o mecanismo para manter o Quércia longe.
O Plano vai funcionar como uma geléia real, e vai dar um ânimo de alguns meses à economia, reforçando o FH. Depois, é óbvio que haverá consertos a fazer, novas versões de planos, e ajustes. Mas o FH tem tudo para fazer essa correção de rota. O Brasil é uma potência incontível, e mesmo os violentadores-mores do país não conseguirão obstruir o tal do "progresso". Até o Itamar vai ficar para a história como um sereno administrador da tão necessária transição. Falou, Coronel? Geléia Real neles!

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