São Paulo, domingo, 22 de maio de 1994
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Prefeitura vende "céu" para pagar avenida

VICTOR AGOSTINHO; LUIZ HENRIQUE AMARAL
DA REPORTAGEM LOCAL

Para fazer a obra sem precisar usar a verba do orçamento, a prefeitura pretende emitir os Cepacs (Certificados de Potencial Adicional de Construção) –títulos que devem ser negociados na Bolsa de Valores.
Qualquer pessoa poderá comprar os títulos, independentemente de ter terreno ou casa no perímetro da nova avenida.
Quem já possuir imóvel nas redondezas e não quiser comprar Cepacs, poderá construir no limite da lei de zoneamento em vigor.
Possuir esses papéis vai ser a única forma para para poder construir uma área maior do que permite a lei de zoneamento da região afetada pela nova avenida.
Esta restrição pode atrair empresários interessados em realizar grandes projetos na região, como shoppings e prédios comerciais.
A implantação dos Cepacs depende de aprovação da Câmara Municipal. Se aprovado, será uma espécie de dinheiro carimbado.
Ou seja, a quantia arrecadada só poderá ser utilizada em operações urbanas –na obra da Faria Lima ou em outra que a prefeitura venha a realizar no futuro.
O dinheiro não poderá ser usado, por exemplo, para pagar os funcionários públicos municipais.
Os títulos terão validade de 20 anos e serão emitidos por etapas. Conforme forem sendo tocadas as obras, serão lançados Cepacs.
A idéia é que o dinheiro que for sendo obtido com a venda dos títulos seja utilizado para financiar as diversas fases da construção.
No caso da Faria Lima, vão ser lançados Cepacs equivalentes à construção de 2,5 milhões de m2. Isso equivale a dizer que na região o limite proposto para adensamento é de 2,5 milhões de m2.
A prefeitura acredita que Vila Olímpia, Pinheiros e Itaim têm como limite para saturação um total de 4,5 milhões de m2.
A utilização de Cepacs para que sejam construídos prédios com metragens acima do limite do zoneamento apenas poderá ser feita em projetos localizados nos terrenos maiores ou iguais a 1.000 m2.
"Os Cepacs são ótimos para enriquecer quem já é rico", ironiza a arquiteta Raquel Rolnik, professora da PUC de Campinas e ex-diretora de planejamento da administração Erundina (PT).
Segundo Rolnik, só poderão comprar os títulos as pessoas com dinheiro suficiente para deixar o investimento parado por anos.
"A prefeitura vende os bônus na baixa e o empreendedor vai negociar na alta. O lucro não fica com a municipalidade. Com os Cepacs a prefeitura vira instrumento do lucro imobiliário privado."
O engenheiro Celso de Sampaio Amaral Neto, sócio da Amaral D'Avila Engenharia de Avaliações, discorda de Rolnik.
"O Cepac cria a possibilidade de a cidade crescer verticalmente em regiões onde já existe infra-estrutura, como água, luz, transporte, comércio e lazer", diz.
Ele lembra que São Paulo tem tido um crescimento vertical nos últimos anos, se expandindo para bairros distantes do centro, como Vila Prudente.
"A instalação dessa infra-estrutura é cara para o poder público. A região de Pinheiros e Vila Olímpia, que já a possuem, não podem continuar ocupadas por pequenos sobrados", diz.
O consultor imobiliário Lincoln Jorge Marques também defende o Cepac. Ele lembra que os desapropriados podem receber a indenização em Cepacs.
"Até hoje, o desapropriado sempre era prejudicado. Recebia o valor de seu imóvel e, depois que a região recebia a melhoria, havia a valorização. Hoje, ao receber os Cepacs, ele ganha com a valorização da região", diz.
A constitucionalidade do Cepac está sendo questionada na Justiça pelos movimentos que se opõem à obra da Faria Lima.
Segundo parecer do professor titular de direito tributário da USP, José Afonso da Silva, o Cepac é um título de capitalização, cuja operação tem que ser do Banco Central, e não da prefeitura.
(VA e LHA)

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