São Paulo, segunda-feira, 30 de maio de 1994
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Odeio o marketing político

FRANCESC PETIT

Mesmo detestando a idéia de me ver envolvido em campanhas políticas, partidos ou figuras da nossa política, devo reconhecer que estas criaturas têm um fascínio muito forte e que é quase impossível um publicitário ficar à margem de um fato tão importante como a eleição para presidente.
Mas é mais impressionante ainda como depois dos inúmeros escândalos políticos, esses mesmos senhores do poder circulam e falam ao povo como se nada tivesse acontecido, o que prova que ética, moral e bons costumes não pesam nada na hora de votar.
Com o panorama praticamente definido, o PT já festeja a vitória, com o discurso de sempre que, ao que parece, emociona os humildes e os trabalhadores; assim o PT fica nitidamente com as esquerdas socialistas. A esquerda intelectual e as elites do país torcem pelo ex-chanceler Fernando Henrique, uma boa parte da classe média alta também e, se seu plano FHC der certo, poderá perturbar as ilusões do PT. Assim, cada candidato vai ocupando um espaço coerente com sua personalidade. O Orestes Quércia, político dos mais competentes, do nível de ACM e Brizola, está saindo do nada, mas já mostra as garras do seu poderoso eleitorado interiorano e sua excelente articulação política com a escolha de uma senhora com jeito bem brasileiro, típica dona de casa, sem passado político e nome bem conhecido, o mesmo do marido, Iris Rezende, que, como idéia de marketing é a mais brilhante até o momento. Sem dúvida a "mulher" nessas eleições poderá ter um peso muito forte, quase como uma resposta ao machismo nacional, que impera na política brasileira há mais de cem anos.
O Amin, figura simpática, boa para fazer propaganda –sua imagem é extremamente forte–, se baseia no discurso da extrema direita de atacar o Fidel Castro brasileiro, o que não creio que tenha muito sucesso, pois a direita é forte e existe, mas está fora de moda.
O Brizola é um verdadeiro "clássico" da política brasileira, pioneiro do socialismo, com prestígio nos mais importantes escalões da Europa, como Felipe González, Mitterrand, fica atolado a um eleitorado cativo, fiel, mas que dificilmente poderá morder fatias dos seus rivais.
Vendo o panorama geral, sobra um segmento importante da sociedade que nenhum dos grandes candidatos pensou em pegar como tema de campanha: trata-se da juventude, dos jovens de 15 a 25 anos. Usando uma velha frase que o Paulo Ghirotti me lembrou: "não confio em ninguém com mais de 30 anos". Essa é uma realidade, os velhos estão comprometidos com o sistema, estão de rabo preso com o contexto político nacional, e não vão conseguir se livrar dos velhos vícios e macetes. Assim fica valendo quem tiver um discurso forte e honesto, chamando os jovens a questionar os velhos, a por em cheque absolutamente tudo o que envolve a política nacional, um político que tenha a coragem de falar com os jovens, a mudar o país, um discurso contra os conformistas, contra os jovens velhos, contra as dondocas de 18 anos, contra os boyzinhos do Establishment...
Um discurso que emocione os jovens herdeiros do movimento estudantil de 68 em Paris, ou dos jovens da praça Tien An Men em Pequim, que enfrentaram os tanques da ditadura comunista em 1989, ou dos movimentos anarquistas da Espanha, os beatniks americanos, o movimento hippie da flor e do amor do festival de Woodstock, e de todos os jovens inteligentes e participantes.
Esse poderá ser um marketing agressivo e baseado em todas as pesquisas. É um segmento considerável da sociedade brasileira, quem sabe o mais importante. Acho que uma boa campanha, dirigida à juventude, sincera e corajosa, pode fazer um belo estrago na concorrência...

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