São Paulo, terça-feira, 31 de maio de 1994
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Sobraram anões

CLÓVIS ROSSI

Sobram anões
SÃO PAULO – Há muito mais anões espalhados pelo Congresso Nacional do que os poucos que foram apanhados no escândalo do Orçamento. Podem até não ser anões no sentido do ataque rasteiro aos cofres públicos, mas são, de qualquer modo, anões políticos.
Prova-o o tratamento que está sendo dado à revisão constitucional. Primeiro, o Congresso não conseguiu fazê-la, o que, embora não surpreenda ninguém, nem por isso deixa de ser lamentável.
Agora, em cima do serviço não-feito, os congressistas preparam-se para algo ainda pior: impedir que o serviço seja bem-feito no futuro próximo.
Em vez de pelo menos discutir a hipótese de convocação de uma assembléia revisora exclusiva, tal como esta Folha defendeu, o Congresso analisa uma proposta que só pode ser chamada de ridícula.
É o projeto do deputado Nelson Jobim (PMDB-RS), que prevê reformas constitucionais a cada dez anos, previamente autorizadas por um referendo popular. A justificativa é a de facilitar o processo de reforma constitucional, já que o mecanismo normal exige quatro votações (dois turnos em cada Casa).
Justificativa grotesca. Montar um referendo a cada vez que se pretender mexer na Constituição equivale a engessá-la do jeito que está.
Ou o Congresso assume que a Carta vigente é suficientemente boa e, portanto, vale a pena criar dificuldades para alterá-la ou assume posição contrária e estabelece os mecanismos necessários para uma revisão decente.
Ficar nesse leguleio é o pior dos mundos. Nem se dá um atestado de validade à Constituição de 1988 nem se facilita a sua reforma.
A única atitude decente dos parlamentares seria reconhecer que foram incapazes de executar a tarefa que estava prevista no momento em que se candidataram em 1990. A partir daí, deveriam ter a altura política necessária para passar a atribuição a um corpo exclusivo, que não ficaria atado nem aos interesses corporativos inevitáveis nos políticos nem ao calendário de tarefas normal de uma Casa legislativa.
Está claro, se ainda fosse necessário, que a maioria dos parlamentares apequenou-se mais uma vez.

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