São Paulo, sexta-feira, 3 de junho de 1994
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As modernas S/A e a cidadania

LUÍS NASSIF

Uma das maiores dificuldades do pensamento de esquerda brasileiro é compreender adequadamente a lógica de funcionamento das empresas, principalmente após as profundas transformações ocorridas nos últimos anos.
A empresa é a peça central de toda economia de mercado. Como tal, é mais importante que seu dono e que seus empregados. É ela o agente principal do desenvolvimento, a geradora de empregos e de lucros, a promotora de investimento.
Hoje em dia, não há lugar onde o sentimento de cidadania seja mais cultuado do que no âmbito das modernas políticas de recursos humanos –algo que teve início, cresce, mas ainda não é majoritário no universo de empresas do país.
O motor de transformação das empresas é, inicialmente, a exposição a uma ampla competição. É só a ameaça que induz à ação. A partir daí, a montagem de pactos de produtividade entre direção e trabalhadores, que terão a possibilidade de interferir com sugestões na atividade produtiva, até participar diretamente dos lucros obtidos e da gestão da empresa.
Empresas de dono
Fariam bem os economistas do círculo próximo a Lula, em estudar mais profundadamente o conceito de empresa –particularmente a empresa de capital aberto, o meio termo ideal entre as empresas de dono e as empresas estatais.
No primeiro caso, há um desequilíbrio flagrante em favor do proprietário. Ele é absoluto. Se for responsável, produz crescimento. Se não for, enriquece às custas da empresa, sem nada que limite sua ação predadora.
Esse empresário tem a virtude de ser o empreendedor, o sujeito que tem a iniciativa, corre o risco, junta os fatores de produção e cria a empresa. Depois que a empresa ganha consistência e forma, cresce e fica complexa, fica sem defesa contra suas eventuais irresponsabilidades.
No caso das empresas estatais tem-se a vantagem de um corpo de funcionários coeso, agindo como uma verdadeira corporação, mas também sem limites à sua atuação –já que o Estado não é um controlador atuante. Sem a pressão externa, mesmo que queiram, os diretores terão dificuldades em comandar processos de reestruturação, em desmanchar feudos internos e motivar os empregados para a busca da produtividade.
As modernas S/A
A moderna sociedade anônima é muito mais equilibrada que ambos os modelos. Ao abrir capital, as empresas passam a ter que atender a três interessados –o acionista majoritário, os trabalhadores e os investidores minoritários. É em torno deste conflito que a empresa torna-se dinâmica e preserva sua vocação de crescimento.
Aí tem-se a empresa pública na sua acepção, com controle da cidadania, e tornando os cidadãos (individualmente ou através de fundos) sócios do seu crescimento.
Com uma moderna lei a seu lado, os minoritários impedem os abusos dos controladores, mantem sob pressão permanente os administradores, que passam a atuar em busca de resultados. Este tripé (diretores representando os controladores, empregados e minoritários) acaba impedindo abusos recíprocos.
Se deixá-la apenas em mãos do controlador, corre-se o risco, comum no Brasil, de tornar as empresas pobres e os donos ricos. Se o poder se desequilibra em direção aos trabalhadores, as demandas salariais podem comprometer o investimento (como ocorre com as estatais) e o emprego (restringindo o emprego e o investimento). Se se desequilibra em direção aos acionistas, garante-se o ganho do capital em detrimento do futuro da companhia.

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