São Paulo, sexta-feira, 3 de junho de 1994
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Uma história mal contada

ALBERTO HELENA JR.

Essa história de Branco está mal contada. Quer dizer: não duvido que o jogador tenha apenas uma dor nas costas, ciática ou que seja, reflexo de treinamentos mal executados ainda no Fluminense, há dois meses, como sugeriu o médico Lídio Toledo aqui.
E que essas dores passarão com um descanso de dois ou três dias. Lembro-me que o velho e poderoso Chicão, do São Paulo e da Copa de 78, também, de vez em quando, curvava-se todo, retorcia-se mesmo, sob tais dores. Dois dias depois, entrava em campo e dizimava, literalmente, os adversários.
O problema com Branco, porém, é outro. De um lateral moderno, sobretudo o esquerdo no esquema desta seleção em que o ponta Zinho nunca vai à linha de fundo, exige-se, basicamente, velocidade, um bom preparo físico, enfim.
Branco, há tempos, denota uma progressiva e assustadora lentidão para cumprir com rigor as tarefas dessa função. Se vai, não volta. Se volta, não vai. Quase sempre, nem vai, nem volta. E irrita-se com isso, vê-se claramente lá das tribunas.
Este estágio seria o de recuperação exatamente do fôlego e da velocidade de Branco, pois que ninguém, em são juízo, haverá de lhe negar talento, habilidade, experiência e uma canhota letal, sobretudo de bola parada.
Acontece que estamos por aqui, no eixo Los Gatos-Santa Clara, há mais de uma semana, e Branco mal consegue cumprir três dias de treinamento normal seguidos. Assim, não conseguirá entrar em forma nunca.
Esta é a pergunta que faço a Parreira: afinal, vamos ter um Branco em forma ou não na Copa?
Parreira, em tom grave, com indisfarçável ponta de irritação, responde, lutando contra a incoerência e seu manifesto desejo de manter o jogador no grupo: "Ele não tem nenhuma lesão, ligamentos afetados, distensão muscular, nada disso. Apenas sente dores que se curam com muito repouso. Temos ainda vinte dias até a estréia na Copa do Mundo, logo vale a pena esperar".
Mas esperar por quem? Pelo Branco que ajudou Parreira a ser campeão pelo Fluminense, há dez anos? Pelo Branco que disparava pela lateral com vigor de causar inveja até num Cafu, nas Copas de 86 e 90? Ou por esse Branco que vem se arrastando na seleção e no Flu há meses, e que tem sido, por isso mesmo, o mais criticado de nossos jogadores?
Mais que isso: a dúvida, talvez única, do próprio treinador da seleção. Tanto que, invariavelmente, Parreira tem substituído Branco por Leonardo, em todos os últimos amistosos. E, quando o faz, é da água pro vinho. Não que Leonardo seja mais jogador que Branco. Ao contrário. A diferença é que um está na ponta dos cascos; o outro, na corda bamba.
Sei bem que Parreira é leal a seus amigos, e Branco foi-lhe ponta-firme, no Flu e na própria seleção, nos amargos dias das eliminatórias. Além do mais, sempre haverá a alternativa de se deslocar para a lateral-esquerda ou Mazinho ou Jorginho, entrando Cafu na direita, em caso de perdermos por alguma fatalidade Leonardo.
Mas, valerá a pena correr o risco de termos apenas um lateral canhoto num grupo de 22 jogadores, numa Copa do Mundo, competição de tiro curto e cheia de imprevistos?
O diabo é que me informaram que Roberto Carlos, o terceiro reserva da seleção nessa posição, estava aí, ameaçado por uma pneumonia que prometia aparecer. É muita sopa pro azar.

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