São Paulo, sexta-feira, 3 de junho de 1994 |
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'Foodie' acadêmico não tem tempo para comer
NINA HORTA
Naturalistas O bolo de casamento deles parecia uma enorme pedra marrom glaçada com claras em neve batidas com açúcar mascavo. Moraram em sítio, produziram tudo para sua subsistência, inclusive o mel de abelha que vendiam para os parentes e amigos. Gostam muito de painço, feijão azuki e bardana. Cozinham em panela de ferro, e as saladas da horta seriam deliciosas se não fosse o vinagre maltado e o óleo de girassol. Os filhos de "foodies" naturalistas matam os pais de vergonha quando são convidados para festinhas de aniversário de outras crianças. Comem todos os brigadeiros, avançam no cachorro quente e estufam o bolso com pirulitos para chupar em casa. Acadêmicos Lêem sobre a comida o dia inteiro. Têm três mil livros espalhados pela casa e mantêm correspondência com todos os editores estrangeiros de livros de comida. Recebem catálogos com a produção de livros do ano seguinte, especificados mês a mês. Assinam todas as revistas de culinária, desde as inglesas, mais intelectualizadas, às de fofoca, americanas, que contam quem roubou o chef de cozinha de quem. Cozinham só por receitas e não têm vergonha de dizer que ainda não sabem de cor os ingredientes daquele mesmo bolo que queimam há trinta anos. Quando resolvem cozinhar escolhem a receita de um livro como "O livro de cozinha da infanta Dona Maria", com indicações de como se fazer uma galinha bem gostosa. São tão envolvidos por comida que não têm tempo para cozinhar ou para comer. Quem os encontra no supermercado e sabe de sua fama "cult-foodie" pensa que a compra no carrinho é para o cachorro. Latas de atum, salsichas, fibra prensada, iogurtes e suco de laranja. Mas, sempre dormem contentes porque estão convencidos de que o melhor modo de estudar a humanidade é através da comida. Texto Anterior: Cotação Próximo Texto: Ingredientes Índice |
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