São Paulo, sexta-feira, 3 de junho de 1994
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Brasileiros recuperam público perdido

JOSÉ GERALDO COUTO
DA REPORTAGEM LOCAL

O guerrilheiro Carlos Lamarca está ajudando o cinema brasileiro a recuperar o mercado perdido nos últimos três anos.
Os cinco filmes nacionais lançados este ano nos cinemas já foram vistos por 150 mil espectadores. "Lamarca" atraiu sozinho a metade desse público.
Esses números podem não parecer espetaculares, mas são expressivos no atual contexto: em todo o ano passado, 120 mil pessoas viram os filmes brasileiros na tela grande –número que "Lamarca", ainda em cartaz em oito capitais, deve atingir em poucas semanas.
Outra comparação útil pode ser feita com um filme de prestígio como "Short Cuts", de Robert Altman, que foi visto por 85 mil espectadores brasileiros em 11 semanas. Os 73.513 que viram "Lamarca" o fizeram em um mês.
Mas não se pode concluir daí que o filme de Sérgio Rezende seja mais bem-sucedido que o de Altman: de acordo com a distribuidora Columbia, a performance de "Short Cuts" foi alcançada com apenas seis cópias, o que dá a excelente média de 14.166 espectadores por cópia. Isso significa filas em quase todas as sessões.
"Lamarca", com 15 cópias, tem uma média bem mais modesta: 4.900 ingressos/cópia.
A comparação com "Short Cuts" não é fortuita. De acordo com Paulo Sérgio de Almeida, diretor da distribuidora Riofilme, os brasileiros devem entrar na fatia do mercado ocupada pelo chamado cinema internacional de arte, que inclui filmes como o de Altman.
Segundo Almeida, a situação do cinema nacional melhorou 500% em relação ao ano passado.
Com pelo menos oito títulos a serem lançados até dezembro, Almeida estima que 600 mil pessoas verão filmes brasileiros este ano –sem contar os telespectadores do longa "Veja Esta Canção", de Cacá Diegues, exibido pela TV Cultura (leia reportagem abaixo).
Para Adhemar de Oliveira, diretor da distribuidora Filmes do Estação e do Espaço Banco Nacional de Cinema, a situação é animadora se olharmos "um pouco para trás, mas não muito, pois há 15 anos um filme como `Dona Flor' tinha 12 milhões de espectadores".
Ingresso caro
Tempos de vacas gordas como aqueles estão definitivamente descartados –e não só para os filmes brasileiros. Em 1993, o filme mais visto em todo o mundo –"Parque dos Dinossauros", de Spielberg– não teve mais que cinco milhões de espectadores no Brasil.
Além da recessão e do fechamento de salas de cinema (hoje há menos de mil em todo o país), Almeida aponta o aumento do preço do ingresso como fator de retração do público. No fim dos anos 70, o ingresso custava o equivalente a US$ 0,70. Hoje custa US$ 2,89.
Estratégia de teatro
Para fazer frente aos novos tempos, Adhemar de Oliveira sugere uma mudança radical nas estratégias de lançamento e marketing dos filmes brasileiros. Segundo ele, os filmes deviam ser lançados com tempo limitado: duas semanas de exibição, por exemplo.
"Como acontece frequentemente no teatro, a publicidade do filme poderia dizer: `Curta temporada', ou `Só até tal dia"', diz Oliveira, que este ano distribuiu o brasileiro "Alma Corsária", de Carlos Reichenbach (15.500 espectadores).
"O que acontece muitas vezes é que o espectador deixa para ver o filme na semana seguinte e ele acaba saindo de cartaz antes disso por falta de público", diz Oliveira.
Almeida, da Riofilme, sem saber da proposta da "curta temporada", reforça a tese: "É muito difícil hoje um filme chegar à terceira semana de exibição".
Uma forma de manter um filme em cartaz por mais tempo pode ser a adotada por André Klotzel com seu filme "Capitalismo Selvagem".
Através da Lei Mendonça (mecanismo municipal de incentivo fiscal), a empresa Enterpa comprou 6.000 ingressos do filme e distribuiu para funcionários e alunos de escolas.
Além desse público contemplado com ingressos gratuitos, 10.200 pessoas pagaram para ver o filme.
Os outros títulos brasileiros exibidos este ano até agora foram o infantil "Era uma Vez", de Arturo Uranga (28 mil espectadores), e "A Terceira Margem do Rio" (23 mil espectadores). Ambos renderam menos que o esperado.
O primeiro, porque um filme destinado às crianças, se quiser estourar na bilheteria, dificilmente pode prescindir hoje de estrelas de televisão como Xuxa ou os Trapalhões. O segundo porque não agradou a crítica e foi mal recebido no Festival de Berlim.
Os outros foram "A Maldição do Sampaku", de José Joffily, "Não Quero Falar sobre Isso Agora", de Mauro Farias, "Vagas para Moças", de Paulo Thiago, e "Escorpião Escarlate", de Ivan Cardoso. Os três últimos nem chegaram a passar em São Paulo.

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