São Paulo, domingo, 5 de junho de 1994
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Inflação define o futuro da nova moeda

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

As inflações de julho, primeiro mês da nova moeda, e de agosto vão definir a sorte do Plano Real.
Ninguém no mercado financeiro sabe ao certo qual será a inflação de julho. Mas hoje já é mais usual o "chute" de 5% –número que era teto 30 dias atrás.
Todos os analistas e executivos ouvidos pela Folha, porém, têm certeza de que o juro será suficientemente alto para contemplar qualquer que seja a inflação. "Será um mês de grandes emoções", define José Roberto Mendonça de Barros, da consultoria MBA.
"Na primeira semana de julho será possível aos bancos e ao Banco Central (BC) fazer um cálculo ponta-a-ponta do comportamento da inflação. O BC pode rapidamente alterar a política de juros", diz Mendonça de Barros.
É por isto, diz o consultor, que o BC escolheu o caminho dos títulos pós-fixados para a transição, diminuindo os riscos de perda para o investidor. "As flutuações nos juros podem ser gigantescas."
O seguinte cenário não está descartado: juros de abertura de julho no over ao redor de 9% e, na segunda semana, de 12% ou de 7%.
Quem define o caminho das taxas é a inflação e a necessidade de impedir um eventual aquecimento do consumo –que poderia sancionar aumentos de preços.
Pedro Bodin, ex-diretor do BC e, atualmente, no Banco Icatu, diz que o "mês crucial para o plano será agosto. A inflação de julho está cheia de resíduo, a de agosto não. Ela vai definir se a estrutura do plano poderá ser mantida".
Bodin definiu da seguinte maneira a estrutura do plano: câmbio, salários e tarifas públicas estáveis, segundo o termo utilizado pelo ministro Rubens Ricupero, por um tempo indeterminado.
Em parte, segundo os analistas, o resíduo de julho é erro de pilotagem da equipe econômica. Ela deixou para o último mês de vida do cruzeiro real a definição das regras de conversão de alguns peso-pesados dos índices de inflação, como aluguéis, tarifas e preços públicos e mensalidades escolares.
Bodin diz que todos os demais planos que produziram queda abrupta da inflação acabaram gerando algum reaquecimento da economia. "Se é para errar, melhor errar por excesso de aperto no crédito", diz.
O crucial, para ele, é que o governo, utilizando todos os instrumentos à sua disposição, controle a inflação de agosto. É que "não será possível manter tudo parado com uma inflação de 5% ao mês."
Cândido Bracher, do BBA Creditanstalt, concorda com Bodin e diz não ter idéia sobre qual será a inflação de julho.
Embora concordando com a avaliação técnica de Bodin, Mendonça de Barros afirma que a inflação de julho é importante "politicamente. É ela que vai balizar a política monetária e também a cabeça da maior parte das pessoas, inclusive do próprio mercado".
Regra flexível
"O governo não vai querer impor à sociedade uma estabilização a qualquer preço". A avaliação é de Amaury Bier, economista-chefe do Citibank. Para ele, a política monetária não terá regra inflexível.
"Com o câmbio fixo não dá para estabelecer regras rígidas para o comportamento da base monetária (dinheiro em poder do público mais reservas bancárias). A base vai flutuar de acordo com as reservas internacionais (o caixa do BC em moeda forte)", afirma. "Ninguém sabe ao certo qual será a demanda por moeda".
O BC não poderá fazer política monetária controlando a quantidade de emissão de reais. "Vai controlar é a taxa de juros", diz Bier.
"Uma política de controle quantitativo tem grandes inimigos: os bancos oficiais", completa José Roberto Mendonça de Barros, da consultoria MBA.
Elevar o compulsório (percentual sobre as contas que os bancos têm que manter depositado no BC) significa tirar fôlego destas instituições já fragilizadas com a perda do imposto inflacionário. O BC pode desejar tudo na entrada do real, menos uma crise bancária.
Para Mendonça de Barros, o governo deve estabelecer metas monetárias, "mas o que vai contar mesmo é a taxa de juros".
Executivos e analistas desenham um cenário de alguma monetização (com inflação baixa, pessoas e empresas deixam mais recursos nas contas correntes e na carteira), mas nada parecido com o que aconteceu no Plano Cruzado.
A base monetária pode crescer dos atuais 0,7% do PIB (Produto Interno Bruto) para 3% do PIB.
"Não haverá, no início, mudanças drásticas no perfil das aplicações. As pessoas vão continuar dando preferência pela liquidez", diz Pedro Bodin, do Banco Icatu.

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