São Paulo, domingo, 5 de junho de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Livro ensina Dia D a Clinton

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Nos preparativos para sua viagem à Europa para comemorar os 50 anos do Dia D, o presidente dos EUA, Bill Clinton, foi brifado por historiadores e comandantes militares sobre os detalhes estratégicos da batalha.
Ele ficou muito impressionado com a revelação, para ele desconhecida, de que o Dia D não foi o sucesso antevisto pelos planejadores. Muita coisa deu errado, saiu diferente do programado.
Houve momentos em que até a possibilidade de derrota foi levantada por alguns dos líderes das tropas aliadas. O fato de, apesar desses pequenos desastres, tudo ter dado certo no final animou Clinton.
Ele passou a comparar o seu governo com o Dia D. Acha que os tropeços enormes que tem sofrido vão ser esquecidos quando o mundo se defrontar com sua vitória final.
Um dos historiadores que mais causaram efeito sobre o presidente foi Stephen Ambrose, diretor do Eisenhower Center, da Universidade de Nova Orleans, e autor do livro "D Day, June 6, 1944" (Simon & Schuster, 656 páginas, US$ 30,00).
O trabalho de Ambrose foi o livro que Clinton foi lendo em seu vôo diurno para Roma na quarta-feira e é o mais vendido entre a enorme lista de livros, vídeos, CD-ROMs sobre o Dia D que invadiu o mercado americano nas últimas semanas.
Ele é baseado em mais de 1.200 depoimentos de participantes da que tem sido chamada de última grande batalha militar da história. De recrutas a comandantes.
É um "O Mais Longo dos Dias" (o filme), muito melhor documentado e com um nível de sofisticação bastante superior.
A crueza do relato dos sobreviventes, por exemplo, da invasão da praia chamada Omaha, onde 2.300 soldados americanos morreram em 24 horas e o comandante da operação, general Omar Bradley, chegou a contemplar seriamente a possibilidade de bater em retirada, é chocante.
Omaha foi a segunda maior decepção do Dia D. Os soldados dos EUA chegaram à praia já meio derrotados pelo enjôo, encontraram armadilhas alemãs não antevistas pela inteligência aliada e uma resistência muito superior à que se esperava.
A maior surpresa negativa foi a não conquista da cidade de Caen no Dia D, considerada uma posição vital para o sucesso de todas as missões posteriores das tropas aliadas na Europa.
O relato de Ambrose sugere, e talvez Clinton não tenha percebido, que o Dia D pode ter sido mais uma derrota alemã do que uma vitória aliada.
O comando teleguiado por Berlim, onde um Hitler decrépito já não era mais confiável, o moral abatido em todos os níveis da hierarquia nazista, a falta de recursos materiais da defesa podem ter contribuído muito mais para o resultado da batalha do que o planejamento detalhado, as operações de contra-inteligência e a estratégia anglo-americana em geral.
O comandante que Clinton enfrenta na política americana, o senador Bob Dole, participou do Dia D e está longe da decrepitude de Hitler. Se Clinton quer aproveitar os ensinamentos de Ambrose, que pense nisso.

Texto Anterior: Sobrenome inferniza repórter
Próximo Texto: Leia alguns destaques de ontem na imprensa internacional:
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.