São Paulo, quarta-feira, 15 de junho de 1994
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Amesquinhando a economia

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – É assustadora a quantidade de análises econômicas que estão sendo publicadas nos últimos meses afirmando que o Brasil se modernizou e está maduro para o grande salto para a frente. Faltaria apenas, segundo essas análises, reformar o Estado e domar a inflação.
A avalanche neoliberal parece ter reduzido o pensamento econômico a uma ninharia. Fica a sensação de que a maioria dos economistas comprou a tese de que o objetivo final de qualquer política econômica é apenas o de sanear as contas públicas e criar condições para que o setor privado tenha lucros.
Não é assim, acho. O único objetivo de qualquer política econômica é fazer feliz todos e cada um dos cidadãos de um dado país. Utopia irrealizável? Claro. Mas, se se amesquinhar o objetivo e reduzi-lo a deixar sadio o Estado e fortes as empresas, amesquinha-se também o resultado. Nem se saneia o Estado nem se fortalecem as empresas e muito menos se faz cada cidadão feliz.
Dizer que o país modernizou-se e está pronto para o futuro é ignorar a brutal dívida social. A menos que se tenha desistido de pagá-la ou sequer amortizá-la, vai-se verificar que as chamadas precondições para um futuro menos negro estão muito longe de ter sido alcançadas.
Pegue-se o caso das mensalidades escolares. Todo o mundo ficou condoído com a situação das escolas particulares, cujo futuro estaria ameaçado pela regra de conversão determinada pelo presidente Itamar Franco. É claro que a fórmula adotada é uma loucura técnica inominável.
Mas maluquice maior é preocupar-se unicamente com a escola particular. Não vi ninguém deitar um olharzinho, ainda que fosse só de piedade, para a escola pública. Ninguém perguntou qual é a "mensalidade" que a sociedade deveria pagar para que a escola pública volte a ser eficiente.
É uma brutal inversão de prioridades. Que os analistas se incomodem com a eventual falência da escola privada, é justo. Mas deixa de sê-lo quando não dedicam a mesma preocupação à escola pública, que, afinal, será sempre o destino da maioria das crianças, por mais que o país enriqueça e por mais que a sua renda seja distribuída menos indecentemente.

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