São Paulo, domingo, 19 de junho de 1994
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Tomate transgênico recebe aprovação

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Muito satisfeitos ficaram os industriais da biotecnologia com a aprovação, pelo governo norte-americano, da comercialização para uso humano do tomate Flavr Savr produzido pela empresa Calgene, de Davis, Califórnia.
Contra a medida, embora reconhecendo a inocuidade do novo produto, manifestaram-se alguns ativistas da Campanha pelo Alimento Puro, inveterados inimigos da engenharia genética, e alguns críticos que fizeram restrições médicas que parecem infundadas.
Há mais de 20 anos os biotecnologistas inserem genes estranhos em plantas e animais na esperança de obter variedades melhores quanto a valor nutritivo, gosto, resistência a doenças etc.
Têm alardeado muitos êxitos, como a produção de arroz com mais proteína, óleos com menos gorduras saturadas (favorecedoras do acúmulo do colesterol nocivo), frutas de maior duração nas prateleiras e mais saborosas, melões, abóboras e pepinos resistentes a vírus, milho resistente a pragas e herbicidas, batatas com mais amido e assim por diante.
Existem também malogros, como o que resultou de tentativa do Ministério da Agricultura dos Estados Unidos de injetar gene humano em embriões de porco, com o objetivo de conseguir produto com menos gordura. O que obteve foi apenas um monstrengo.
Simplicidade aparente
Explicada em palavras muito simples, a técnica consiste em introduzir o gene desejado em culturas de tecidos.
Mas a simplicidade é apenas aparente, pois as manipulações são muitas e demoradas, começando com a seleção e o isolamento do gene.
Alegam todavia os biotecnologistas que, apesar disso, sua prática é mais rápida e direta do que o método convencional dos cruzamentos, que requerem o trabalho com muitas gerações, mas aos quais devemos enormes progressos. Haja vista os trabalhos do Instituto Agronômico de Campinas no melhoramento do café, do algodão e de outras plantas.
O tomate da Calgene é o primeiro alimento a ser geneticamente alterado pela biologia molecular.
São dois os genes nele aproveitados. Um é a cópia "reversa" de um gene que comanda a expressão da poligalactonurase, enzima que quebra as paredes celulares.
Assim se impede o amolecimento prematuro dos tomates, permitindo sua maior permanência na planta e melhorando seu sabor.
É grande a vantagem sobre os processos atuais, que exigem a colheita dos frutos ainda verdes e seu amadurecimento forçado, às vezes com exposição ao gás etileno.
O segundo gene utilizado produz uma proteína que confere resistência ao antibiótico canamicina, que permite reconhecer se de fato ocorreu a recombinação genética no começo do desenvolvimento, pois as células morrem na ausência do gene.
Objeções
Objetaram alguns que o antibiótico poderia passar à pessoa que comesse o tomate, prejudicando o emprego dele em caso de doença.
Os especialistas da Calgene examinaram essa hipótese e verificaram que os produtos do gene são digeridos e assim destruídos, não havendo a possibilidade de contaminação das células humanas.
Generalizando essa observação, Carl Winter, da Universidade da Califórnia em Davis, afirmou à revista "Time" que as modernas técnicas da bioengenharia apresentam menor risco do aparecimento de características indesejáveis do que os cruzamentos convencionais.
Produtos como o leite e o queijo, explica Constance Holden em "Science" (264, 512), já se beneficiam da biotecnologia para melhorar produção e processamento, mas o tomate da Calgene é o primeiro alimento que encerra genes novos, que não se poderiam obter pelos métodos habituais de cruzamento.

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