São Paulo, segunda-feira, 20 de junho de 1994
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Monopólio da bola

O Brasil estréia hoje na Copa do Mundo de futebol, nos Estados Unidos. A julgar pelo que ocorreu por ocasião dos campeonatos mundiais anteriores, o país deve praticamente parar para torcer por sua seleção.
Que uma tal concentração de atenções e energias ocorra durante o par de horas que dura cada partida –ressalvadas as atividades que, por serem essenciais, não podem parar– é um fato essencialmente positivo. Revela, além de um saudável gosto pelo lúdico, que a auto-estima dos brasileiros, pelo menos nesse terreno, não está tão baixa quanto a interminável crise econômica e os desenganos políticos poderiam fazer supor.
Há, contudo, que se evitar os exageros que também costumam ocorrer nesses períodos. Um país em que, tradicionalmente, a atividade econômica e o funcionamento das instituições se ressentem da grande quantidade de feriados –eventualmente prolongados pela proximidade com o fim-de-semana– não pode diminuir seu ritmo de trabalho ou suspender parte de suas atividades cotidianas em função de uma tal monomania.
Os temores de que excessos dessa natureza ocorram com maior intensidade este ano não são gratuitos. Fundam-se na constatação de que, mais que qualquer copa anterior, a de 94 tem quase monopolizado as atenções da sociedade, da propaganda e da mídia –sobretudo a eletrônica–, deixando em segundo plano até mesmo a iminência da implantação de uma nova moeda e a discussão política sobre as eleições de outubro.
Nada indica que haja uma relação direta entre a torcida pela seleção e a queda de interesse por assuntos relevantes para a vida nacional, mas não constituirá excesso de zelo permanecer alerta contra essa possível distorção –sobretudo porque, a menos que sobrevenha uma mudança institucional na Fifa ou no Estado brasileiro, as copas do mundo e as eleições gerais sempre coincidirão. E não será nada proveitoso para o país se as primeiras obscurecerem as últimas, ou, indiretamente, influírem em seus resultados.

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