São Paulo, quarta-feira, 6 de julho de 1994
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Roberto Baggio "ressuscita" e salva a Itália

SÍLVIO LANCELLOTTI
ENVIADO ESPECIAL A FOXBORO

Roberto Baggio 'ressuscita' e salva a Itália
Atacante empata jogo contra Nigéria aos 43min do 2º tempo e faz na prorrogação, de pênalti, o gol da vitória
Teve dois atos e um epílogo completamente diferentes a ópera dramática em que a Itália eliminou a Nigéria do Mundial, ao vencer por 2 a 1, no estádio de Foxboro, vizinhanças de Boston.
O primeiro se definiu num título patético: "Aqui jaz Roberto Baggio". O segundo soou quase como uma epopéia: "Roberto Baggio ressuscitou". O desfecho foi heróico: "Roberto Baggio é o salvador da 'Azzurra' no Mundial".
As dificuldades da Itália existiram principalmente porque Baggio, o seu suposto tenor e maior solista, inexistiu no palco até os dois momentos decisivos dos tentos da sua equipe -o gol de empate aos 43min do 2º tempo e o tento de pênalti aos 13min da prorrogação.
Erros
O sufoco do time italiano foi provocado também pela arbitragem. A "Squadra Azzurra" teve de enfrentar a regência desastrosa do árbitro mexicano Arturo Brizio-Carter.
Aos 33min, já depois do gol do nigeriano Amunike, a "Azzurra" reclamou de um pênalti sobre Roberto Baggio.
Aos 73min, a seleção italiana pediu um outro pênalti, no meio-campo Dino Baggio. Aos 75min, a Itália reclamou mais um, no recém-entrado Zola.
No lance seguinte, Zola tentou proteger a pelota do nigeriano Austen Eguavoen e Brizio-Carter cometeu o equívoco da sua carreira -expulsou o jogador peninsular da peleja.
Talvez com o placar moral do cotejo martelando a sua consciência, o árbitro mexicano apontou na prorrogação o pênalti mais duvidoso dos quatro à sua disposição, no choque do nigeriano Eguavoen com Benarrivo.
Alívio
A 15 metros acima do campo, nas tribunas de imprensa, se acomodavam três personagens muito importantes da "Azzurra" -o ex-craque Carlo Ancelotti, assistente de Arrigo Sacchi, o preparador físico Vincenzo Pincolini e o "scout" Roberto Guidoli, encarregado das estatísticas da seleção.
Ancelotti literalmente transmitia o jogo a Guidoli que digitava tudo num minicomputador -enquanto Pincolini fazia as anotações indispensáveis ao papo de intervalo.
Os três foram estritamente profissionais até o tento do empate por Roberto Baggio. Então, Ancelotti se levantou da cadeira e espancou a madeira à sua frente.
Foi o fim das anotações. Ancelotti mandou tudo àquele lugar com uma frase intraduzível: "Basta con questo cazzo".
Perguntei a Pincolini se a "Azzurra" teria fôlego para resistir à prorrogação com só dez homens. Ele me respondeu com um sorriso: "Vocês, do Brasil, são testemunhas de que, nesta Copa, com dez homens não se perde".
Mais empolgado, Ancelotti completou: "Se a Nigéria vencer esta partida você pode me chamar de cornudo". Felizmente, não houve tal necessidade.
Logo depois, no momento em que Baggio se aprestava a bater o pênalti, Pincolini tirou a camisa e, com ela, cobriu a careca. O novo gol despertou outra vez a reação de Ancelotti sobre a madeira.
Quando, enfim, a prorrogação terminou, os três se abraçaram fervorosamente.
Vincenzo Pincolini se despediu com uma frase preocupada: "Agora, temos três dias para recuperar as energias físicas. E para pedir a Deus mais uma dose de energias espirituais".

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