São Paulo, quarta-feira, 6 de julho de 1994
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Bisol é ingênuo ou salafrário

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Discretamente, caciques do PSDB e PFL comemoraram ontem a decisão do PT de manter o senador José Paulo Bisol como vice na chapa de Lula. Eles planejam explorar eleitoralmente o episódio.
É um prato cheio a ser manipulado em horário eleitoral gratuito. O fato: Bisol apresentou emenda superfaturada para uma cidade na qual ele tem fazenda.
Só fico imaginando o que o PT faria se Guilherme Palmeira, vice de Fernando Henrique Cardoso, fosse o autor dessas emendas. E mais: se Bisol tivesse de julgá-lo na CPI do Orçamento. Duvido que não fosse proposta cassação.
O PT é vítima de si próprio ao estimular uma visão simplória sobre o Congresso, onde, segundo Lula, há pelo menos "300 picaretas". Com isso apenas reforçou preconceitos sobre os políticos. Bisol também é vítima de si próprio: na CPI do Orçamento não dava o benefício da dúvida.
Curiosa a reação do PT e de Bisol: por trás das acusações, haveria um complô. É exatamente a mesma reação dos réus que passaram pela CPI do Orçamento.
Estou convencido de que, por trás das emendas, houve uma mutreta –mas, sinceramente, não estou ainda (repito, ainda) convencido de que Bisol seja um salafrário. Então sobra uma alternativa: ele foi ingênuo. Uma ingenuidade raras vezes vista entre os políticos profissionais.
O fato é que Bisol não tem mais condições morais de ser candidato a vice. O senador está diante de duas hipóteses. Ambas incômodas:
1) utilizou sua influência em causa própria e, assim, cometeu um crime condenado a pleno pulmões por seu partido e por ele próprio.
2) ao ser vítima de uma armação tão pífia, foi profundamente ingênuo, mostrando-se incapaz de servir como substituto de Lula. No caso dele, há uma agravante: ele deveria conhecer todos os truques por trás da elaboração do Orçamento.
Ao contrário do que diz Lula, governar o Brasil não é uma "baba". Na Presidência, haverá gente milhares de vezes mais esperta do que um matuto prefeito de interior, capaz de fazer um senador apresentar uma emenda superfaturada.

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