São Paulo, sábado, 9 de julho de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Cadê a explosão de consumo ?

EMERSON KAPAZ

Cadê a explosão de consumo?
O governo brasileiro está agindo certo ao praticar taxas de juros nos níveis atuais?
NÃO
Se o governo baixar os juros, os empresários poderão aumentar a produção e não os preços
Há um mês os jornais do país estampavam manchetes preocupantes: "Equipe quer juros altos no real para conter consumo". Um tradicional jornal paulista chegou a ostentar uma manchete hilária: "Equipe teme explosão do consumo de alimentos", como se a chegada das moedinhas de real tivesse o poder de entupir os supermercados com os 32 milhões que vivem em estado de miséria.
Muito bem. Chegou o real. Cadê a explosão do consumo?
A verdade é uma só e precisa ser dita em alto e bom som para a equipe econômica: os reajustes de preços efetuados acima da variação da URV nos últimos dias de junho foram suficientemente fortes para inibir o consumo. Não precisamos de juros estratosféricos para frear um suposto consumo que não existe.
Pior: a equipe econômica cometeu um erro primário. A taxa de juros é sinalizadora da inflação do mês. Se em julho ela for de 12%, os agentes econômicos vão se esforçar por elevar seus preços em 12%. Ocorre que o índice de inflação de julho ainda estará contaminado pela inflação residual de junho. Medido pelos institutos de pesquisa, será um índice que captará os aumentos efetuados acima da URV na passagem para o real. A inflação efetiva de julho, em real, deverá ser inferior a 3%, com possibilidade de deflação. Esse percentual só aparecerá em agosto.
Os empresários que necessitam de empréstimos bancários para capital de giro ficaram em uma situação dramática porque não têm como praticar aumento em real este mês. Um juro de 12% já inibiu os negócios em julho.
Se essa situação persistir –preços elevados e juros altos–, as consequências serão devastadoras e colocarão em xeque a eficácia do plano. Teremos uma recessão desnecessária, acompanhada da volta da inflação –os agentes tentando recuperar, via elevação de preços, a perda do volume de vendas.
Entretanto, os preços não poderão aumentar indefinidamente, porque não existe mais a correção mensal dos salários. Em consequência, a indústria e o comércio diminuirão sua atividade, sendo forçados a desempregar. Isso significará ainda menos gente consumindo. Próxima estação: quebradeira de empresas.
Para evitar tudo isso, só resta a negociação. O governo precisa baixar os juros. Em troca, os empresários têm plenas condições de aumentar a produção sem necessidade de elevar os preços. Ao contrário, alguns reajustes cometidos às vésperas do real deverão ser revistos. Os impostos poderão ser reduzidos nas câmaras setoriais, em troca da garantia da elevação da produção e do emprego.
O sistema financeiro pode contribuir muito se passar a financiar a produção. Lamentavelmente, os bancos estão recompondo as tarifas de seus serviços para repor os ganhos que auferiam quando a inflação mensal estava próxima dos 50%. É hora de cobrar desse setor a mesma eficiência exigida do sistema produtivo.

Texto Anterior: Precondições para a estabilidade de preços
Próximo Texto: Um plano cauteloso e não eleitoreiro
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.