São Paulo, segunda-feira, 18 de julho de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Desemprego e política internacional

LUIZ A. P. SOUTO MAIOR

Poucos problemas econômicos causam hoje tanta preocupação aos governantes de países desenvolvidos e em desenvolvimento quanto o do desemprego. Nos primeiros, tem sido historicamente um problema cíclico, condicionado às flutuações da atividade econômica. Mais recentemente transformou-se, porém, em mal endêmico.
Nos 25 países-membros da OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico) –o clube dos países desenvolvidos, com sede em Paris– há hoje cerca de 35 milhões de desempregados, além de outros 15 milhões que simplesmente desistiram de procurar trabalho ou se resignam a ocupações em tempo parcial.
O problema é complexo. Segundo os técnicos daquela organização, o desenvolvimento tecnológico, frequentemente apontado como um dos grandes culpados, teria pouca responsabilidade direta. Embora reduza as oportunidades de trabalho para a mão-de-obra menos qualificada, cria novas possibilidades em funções mais sofisticadas e melhor remuneradas.
A retomada do crescimento econômico –as previsões da OCDE são hoje relativamente otimistas– presumivelmente terá pequeno impacto. Estima-se que o nível de desemprego, da ordem de 8,5% da população ativa, ainda será de cerca de 8,3% em 1995.
Parece claro, pois, que a atividade econômica nas economias avançadas é pouco geradora de empregos. O remédio indicado pelos especialistas da organização seria um misto de modificação da legislação social, com redução ou modificação dos benefícios hoje assegurados aos trabalhadores, sobretudo na Europa, e melhoras nos atuais sistemas de educação e de treinamento da mão-de-obra.
A terapêutica preconizada deixa claro que o problema tem raízes fundamentalmente internas. A opinião pública dos países ricos tem pendido, entretanto, para outras explicações. Movida pelos seus próprios preconceitos culturais e pelo discurso de setores protecionistas, tem preferido responsabilizar os imigrantes e as importações provenientes de países "de mão-de-obra barata".
As consequências são duplamente negativas.
No plano político interno dos próprios países desenvolvidos, a noção de que o imigrante rouba o emprego do operário nacional tem levada a conflitos sociais e ao florescimento de partidos de extrema direita, de orientação nacionalista e racista.
Até agora, tais partidos ou grupos estão longe de representar o pensamento majoritário, mas seu êxito tende a influenciar indiretamente os partidos tradicionais, que não desejam alienar a simpatia de um bloco importante de eleitores.
No plano externo, ganham força várias formas disfarçadas de protecionismo setorial. Multiplicam-se as acusações especiosas de "dumping" e desenvolve-se mesmo o conceito novo de "dumping social" –exportações de países em desenvolvimento, cujos preços competitivos se deveriam à exploração iníqua da mão-de-obra barata–, que justificaria a aplicação de restrições à sua importação.
O perigo deste tipo de atitude é que ignora a realidade presente e compromete o futuro, em prejuízo tanto dos países em desenvolvimento quanto dos desenvolvidos. Segundo a própria OCDE, apenas cerca de 1,5% dos gastos totais nos Estados-membros destinam-se a importações provenientes de não-membros– soma que dificilmente afetaria a economia dos importadores.
Por outro lado, o comércio internacional oferece a melhor oportunidade de estímulo à retomada da atividade econômica dos países desenvolvidos, que sofrem de limitações à adoção de políticas macroeconômicas expansionistas. E os países em desenvolvimento representam hoje um dos segmentos mais dinâmicos desse comércio.
Se os países desenvolvidos desejam combater o desemprego e limitar o influxo de imigrantes sem recorrer a medidas contrárias à consciência democrática da maior parte da sua população, o melhor caminho é estimular as exportações dos países em desenvolvimento, não restringi-las.
É o aumento das exportações que permitirá a estes países tornar-se mais prósperos, o que lhes possibilitará aumentar as suas compras do exterior, dominantemente, do mundo desenvolvido, e oferecer melhores oportunidades aos seus trabalhadores, contribuindo para que não tentem emigrar para o Primeiro Mundo.
O problema é que é muito mais fácil culpar os países pobres. Eles têm escassa capacidade de retaliação e suas populações não votam na eleições dos países ricos...

Texto Anterior: Peso do turismo; Em recuperação; Galinhas preguiçosas; Quem é rico; Dica jurídica; Sem risco; Reta final; Dinheiro limpo
Próximo Texto: A política cambial
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.