São Paulo, sábado, 23 de julho de 1994
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A política industrial do próximo governo

ARMANDO CASTELAR PINHEIRO

Esta nota discute as opções e perspectivas que se colocam para o próximo governo no tema da política industrial, aqui definida como as medidas tomadas pelo setor público para aumentar o valor presente do produto industrial.
Faz sentido ter uma política industrial? Há três respostas para esta pergunta. A primeira é que a própria existência de um governo implica que há política industrial ativa, argumenta que a multiplicidade de falhas de mercado implica que a intervenção do Estado pode levar a uma alocação mais eficiente de recursos.
Finalmente, um último grupo de analistas, ainda que reconhecendo a existência de falhas de mercado, defende que a intervenção do Estado tende a agravar as imperfeições e não eliminá-las. Isto por dois motivos. Um, porque o Estado não tem informação superior à do mercado (antes pelo contrário, dizem alguns) e por isso não tem como sistematicamente aprimorar sua alocação de recursos. Dois, porque a intervenção pública não se daria no sentido de aumentar o bem-estar social, mas sim de beneficiar interesses específicos. De acordo com esta perspectiva, não deve haver política industrial ou, ainda mais forte, deve haver uma antipolítica industrial, com o governo atuando para minimizar suas intervenções e tomá-las o mais neutras possível.
Na prática, a opção de política industrial é tanto uma questão econômica como ideológica. Neste sentido, é interessante constatar que países como o Chile, a Argentina e o México, que durante décadas privilegiaram políticas industriais ativas, são hoje paladinos da não intervenção, enquanto, no caminho inverso, os Estados Unidos levaram recentemente ao poder economistas identificados com a defesa da intervenção estatal.
No Brasil, a opção nos últimos anos tem sido por adotar políticas horizontais e descontinuar o aparato intervencionista introduzido nas últimas décadas. A bem da verdade, cumpre registrar que esta opção tem mais de pragmatismo do que de ideologia. Sem recursos e consciente do anacronismo da sua política industrial, era natural que o país optasse por reduzir o grau de intervenção estatal na economia, liberalizando o comércio exterior, privatizando, desregulamentando etc.
Como deverá ser a política industrial do próximo governo? Dado o componente ideológico enfatizado acima, é impossível uma resposta precisa a esta questão. É provável contudo que, qualquer que seja o governo em 1995-98, sua política industrial comportará:
Continuar a redução da intervenção estatal, eliminando os efeitos negativos da política industrial pretérita sobre as eficiências técnica e alocativa da economia. Paralelamente, deve melhorar a proteção contra práticas desleais de comércio por parte de nossos parceiros. Deve-se continuar, porém, sem avanços substanciais nas questões referentes à regulamentação do mercado de trabalho.
Estimular a alocação de recursos pelo setor privado em atividades cujo retorno social excede o privado, como a pesquisa e o desenvolvimento, a infra-estrutura e as exportações.
Estabelecer parcerias entre os setores público e privado com vistas a reduzir o risco do investimento. Isto pode ser especialmente importante para que este desenvolva e administre a infra-estrutura física do país. Há que se cuidar, todavia, para que esses arranjos não levem a distribuição de favores aos segmentos mais organizados da sociedade.
Aprimorar o aparato jurídico e institucional do país, modernizando as leis, fazendo com que estas sejam cumpridas com presteza, garantindo os direitos dos agentes econômicos e melhorando a atuação das agências governamentais. A redução dos custos de transação e da incerteza que pode ser obtida desta forma é enorme.
O peso que a próxima administração dará a cada uma dessas áreas irá refletir as prioridades da maioria, como indicado pelo resultado das próximas eleições. Os graus de liberdade serão, porém, dados pelo sucesso na frente da estabilização macroeconômica e pela certeza de que não haverá retrocessos no processo de liberalização.

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