São Paulo, quarta-feira, 27 de julho de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

De "coisas menores" e machismo

CLÓVIS ROSSI

SÃO PAULO – Concordo com o senador Fernando Henrique Cardoso quando diz que sua mulher, Ruth, fez uma "colocação infeliz", ao dizer que o "PFL tem Antônio Carlos (Magalhães), mas também tem o Gustavo Krause e o Reinhold Stephanes".
Dona Ruth foi infeliz apenas por ter esquecido de acrescentar, ao lado de ACM, o nome de Guilherme Palmeira, vice de seu marido. Se a antropóloga quis contrapor homens de qualidades no PFL, como Krause e Stephanes, a personalidades, digamos, discutíveis, como ACM, teria a obrigação de arrolar Palmeira nesta segunda categoria.
O noticiário da Folha a respeito das aposentadorias de Palmeira não deixa a menor dúvida. A coligação encabeçada por FHC está diante de um caso praticamente idêntico ao de Bisol. Só para recapitular: Palmeira trabalhou apenas seis anos como auxiliar legislativo do Senado, mas aposentou-se (e como analista legislativo, o mais elevado nível da carreira), beneficiando-se da contagem de tempo de serviço como parlamentar.
Em outras palavras: não trabalhou como auxiliar legislativo e menos ainda como analista legislativo o tempo suficiente para se aposentar, mas ainda assim o fez, acumulando, de resto, tal aposentadoria (hoje de R$ 1,4 mil) com a de parlamentar.
Como no caso Bisol, nenhuma ilegalidade, mas uma profunda imoralidade. Não adianta tentar argumentar que Bisol é acusado de outras imoralidades. Nesse território da ética pública, os pecados não se medem pela quantidades de vezes ou pelos valores monetários envolvidos. Não há, para resumir, meia virgindade quando se trata de respeitar o dinheiro do contribuinte.
No caso Palmeira, há até uma agravante: FHC prontificou-se a anunciar que Palmeira renunciaria de bate-pronto se surgisse contra ele alguma evidência. A evidência está disponível, mas o mais provável é que FHC diga, como disse das acusações a Bisol, que se trata de "coisas menores". Pois é.
Deve ser também "coisa menor" a cena explícita de machismo cometida por FHC, ao dizer que sua mulher dera um palpite infeliz. Mulher é obrigada, então, a ter os palpites do marido?

Texto Anterior: Polícia e preços
Próximo Texto: A história de um desastre
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.