São Paulo, domingo, 31 de julho de 1994
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Papai Noel real

Talvez pareça prematuro pensar desde já no Natal. Para o consumidor, especialmente, as festas de fim de ano certamente ainda parecem estar bastante distantes. Mas, para os produtores, a realidade é quase oposta. Na indústria, sabe-se que produzir leva tempo. Assim, o que será realidade para o consumidor daqui a longos cinco meses torna-se uma preocupação empresarial já a partir do terceiro trimestre.
E as informações disponíveis não são lá muito animadoras. Dão conta de um número crescente de empresas concedendo férias coletivas, que podem ser a ante-sala de futuras dispensas.
Seja porque a nova moeda parece ter despertado uma consciência de valor entre os consumidores, seja porque as altas taxas de juros têm gerado uma forte onda de poupança, as vendas estão hoje em níveis inferiores ao que se chegou a imaginar (ou temer) antes da última fase de implementação do Plano Real. E os mesmos juros elevados, além de transformar consumidores em poupadores, aumentam os custos de produção e de comercialização, levando cada empresário a pensar duas vezes antes de apostar na expansão do mercado.
Assim, embora sob outros aspectos o Plano Real esteja apresentando resultados animadores, corre-se o risco de já a partir de agosto configurar-se uma recessão. Se antes se temia pela repetição de uma bolha de consumo ao estilo do Plano Cruzado, agora o que se nota é uma redução do nível de atividades.
O cenário desenhado neste primeiro mês do real parece bastante claro: a inflação, pelo menos no momento e para os próximos meses, deixou de ser o grande problema. Hoje, o desafio é escapar da estagnação, até porque, do ponto de vista do próprio governo federal, ela tende a gerar efeitos eleitorais negativos para o seu candidato à Presidência, o ex-ministro Fernando Henrique Cardoso.
Uma recessão prejudica também o caixa do governo, porque significa, como é óbvio, queda progressiva da arrecadação de impostos.
A manutenção de juros reais excessivamente elevados afeta outro componente das contas públicas, o da dívida interna, cujo pagamento, aliás, consumiu, no primeiro semestre, a maior fatia relativa das despesas. A alta prolongada dos juros é uma armadilha, uma bomba-relógio escondida no coração do plano.
Se o fantasma da inflação está ao menos momentaneamente exorcizado, abre-se espaço para consolidar a estabilização sem uma profunda recessão e pode-se imaginar o Natal, sob esse prisma, num ambiente econômico menos preocupante do que o atual.

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