São Paulo, sábado, 6 de agosto de 1994
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A busca de um objetivo modesto

LUIZ OLAVO BAPTISTA

As dúvidas sobre se o Mercosul se concretizará no final deste ano, quer quanto aos seus objetivos quer quanto aos prazos fundam-se, ao meu ver, no tomar a nuvem por Juno. Ou seja, confundir a modéstia do início e dos objetivos do Mercosul com o sucesso e amplidão da Comunidade Européia.
Ao definir o que entendiam por mercado comum no primeiro artigo do Tratado de Assunção, definiu-se objetivos menores que os dos Tratados de Roma.
Buscava-se no Mercosul apenas o que tecnicamente constitui uma zona aduaneira comum, mais a necessária coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais.
É talvez, a partir da confusão gerada pela expressão mercado comum, que as pessoas se decepcionam porque não acreditam que nasça algo igual à construção européia.
Os prazos, para o que se pretendeu, seriam suficientes se houvesse mais organização e compreensão, e, sobretudo, se tivesse havido maior abertura na discussão e elaboração dos projetos.
Um exemplo é a atuação do Ministério da Justiça que –à exceção do período Célio Borja– não consultou especialistas externos para discutir ou elaborar projetos de convenções.
O simpósio realizado em 1993, na Universidade Gama Filho, por iniciativa do professor Leonardo Greco e o grupo de estudos orientado por Werter Faria e Maristela Basso, em Porto Alegre, são exemplos de útil produção jurídica ignorados, como outros trabalhos, pelo oficialismo.
Além disso, tende-se a ignorar o caráter transitório e provisório do Tratado de Assunção: ele é um anteprojeto.
O tratado estabelece quatro metas para o período de transição: o Programa de Liberação Comercial (PLC), a coordenação de políticas macroeconômicas, uma tarifa externa comum e a adoção de acordos setoriais.
Essas estão quase alcançadas. O PLC quase atingiu seu objetivo final; a coordenação de políticas macroeconômicas foi atrasada pelos percalços políticos por que o Brasil passou, mas agora torna-se possível graças ao sucesso que se prenuncia para o Plano Real, que em suas linhas gerais é subscrito (e demagogias à parte) pelos candidatos a presidente mais cotados pelas pesquisas de opinião pública. Com as devidas correções, deverá ser implantado.
A tarifa externa comum foi adotada ontem e, por último, os acordos setoriais têm sido celebrados, alguns com sucesso e gerando resultados superiores às expectativas, como o da indústria automobilística.
Desse modo apenas a meta das políticas macroeconômicas acha-se atrasada.
A institucionalização, quando as pessoas perceberem que o Mercosul está mais para Benelux que para Comunidade Européia –como venho dizendo desde que li o Tratado de Assunção pela primeira vez–, passa a ser melhor compreendida, e se definirá com o alcance que realmente deve ter: poucas instituições, leves, setoriais, e sempre aprovadas por tratado, para possibilitar o controle democrático.
Nada de criar "mercocratas" gerando regulamentos supranacionais, pois a lembrança da tecnoburocracia dos anos de chumbo ainda está presente na maioria das dificuldades que vivemos.
Nessa perspectiva de modéstia e realismo, se pode dizer que as metas serão alcançadas no prazo previsto.

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