São Paulo, sábado, 13 de agosto de 1994
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O risco do exagero

A maior surpresa do real foi e continua sendo a política cambial. Afinal, esperava-se não apenas paridade entre real e dólar, mas estabilidade por um bom tempo. Não ocorreu a paridade e, com frequência também surpreendente, o câmbio oscila e tende à valorização do real. Em poucas palavras: a oferta de dólares supera a procura. A superoferta contínua faz com que a moeda estrangeira se desvalorize.
É uma política oportuna e bem conduzida até agora. Isso entretanto não significa que se trate de estratégia isenta de riscos. Aliás, não existe tal coisa em economia e é bom que se tenha clareza quanto aos problemas associados a um real valorizado demais.
Há duas dificuldades principais. De um lado, não é segredo que por trás da superoferta de dólares está, ainda, a opção do Banco Central por uma política de juros reais muito altos. A fonte de tantos dólares tem sido, por exemplo, as operações conhecidas como "Antecipações de Contratos de Câmbio", realizadas pelos exportadores. Como as taxas aqui estão elevadas, vale a pena receber o quanto antes os dólares relativos a vendas futuras e trocá-los rapidamente por reais que ficam rendendo juros.
Na prática, as cotações do dólar vão ficando deprimidas. Mais adiante, a armadilha virá à luz do dia: quando os juros finalmente caírem, os exportadores terão de defrontar-se ao mesmo tempo com um câmbio defasado e com o fim da galinha dos ovos de ouro das aplicações financeiras.
De outro lado há os riscos derivados do fato de que a inflação, afinal, não cedeu totalmente. Ainda que cadente, há uma inflação que se acumula (e que será repassada aos salários). Mas o real se valoriza. O correto seria a moeda nacional valorizar-se apenas quando a inflação e os temores de inflação estivessem efetivamente afastados.
O câmbio estável é certamente um reforço à estabilização. O risco do exagero, entretanto, surge quando o governo se compraz não com a estabilidade, mas com a valorização do real, um movimento que pode ter efeitos tão ou mais deletérios que os provocados pela desvalorização cambial no passado.

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